Senador Eduardo Gomes (MDB-TO) afirmou a VEJA que aprovação da reforma da Previdência dá capital político para que governo avance com agenda reformista
Por André Siqueira
Escolhido para a liderança do governo Jair Bolsonaro no Congresso após a destituição da deputada federal Joice Hasselmann (PSL-SP) do cargo, em um dos episódios da crise interna do PSL, o senador Eduardo Gomes (MDB-TO) afirmou que a aprovação da reforma da Previdência cria “um ambiente propositivo” para a tramitação de outras pautas reformistas, consideradas vitais pela equipe econômica do ministro Paulo Guedes.
Deputado federal por três mandatos, Eduardo Gomes foi eleito para o Senado pela primeira vez em 2018 pelo Cidadania, mas migrou para o MDB como um gesto de aproximação ao também senador Renan Calheiros (MDB-AL). Em entrevista a VEJA, Gomes disse, ainda, que o “debate ideológico mais ferrenho” ficará em segundo plano caso haja uma eventual saída do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva da prisão “se o governo estiver bem” e contar com o respaldo da população.
Abaixo, os principais trechos da entrevista:
Causa preocupação ao senhor ter que agir como uma espécie de bombeiro para amenizar crises do PSL? O que a gente entende com relação às crises é que os próprios partidos e os próprios aliados resolvem isso no debate político, não há contaminação. Apesar de todo o quadro de debate nas redes sociais e a situação [de crise] interna do partido, que cresceu muito, isso é compreensível tendo em vista o tempo de governo. O que vim fazer é abrir o espaço do debate para aprovar as pautas do governo.
Quais são as pautas prioritárias após a aprovação da reforma da Previdência? São pautas de reconhecimento, de busca de recursos para investimento, geração de emprego, já que, por muito tempo, ficou difícil tocar qualquer outra pauta simultânea que não fosse a do rigor fiscal, de aprovação da reforma da Previdência. Essa é uma reforma difícil. Outros governos, mais consolidados e mais maduros e populares, não conseguiram. O Congresso se prepara, agora, para políticas de desenvolvimento e para a discussão de uma nova ordem federativa, que é o que o presidente, de maneira discreta até, vem fazendo na prática.
A atuação dos filhos do presidente, Carlos e Eduardo, nas redes sociais, é danosa ao governo? É uma nova plataforma de luta política que ainda não tem seus efeitos estudados. Eles cresceram muito nesse campo. Pessoalmente, tenho uma atuação muito limitada nas redes. Não tenho muitos seguidores nem perseguidores. Mas penso que é necessário separar o governo da luta política. Há parlamentares que tiveram votação expressiva e nunca tinham assumido nenhum cargo público. É um momento novo, a gente vai aprendendo aos poucos.
O Twitter é uma espécie de Diário Oficial do presidente, não? É a arma direta de qualquer cidadão que se acha provocado a questionar qualquer autoridade. É adaptação de um processo democrático, ainda vamos chegar a um bom tom. A família brasileira passou por um processo eleitoral em que todo mundo comentou e discutiu política. Passou o tempo em que a gente sabia exatamente quem era a fofoqueira da família. Hoje quase todos são.
A reforma tributária já foi colocada em discussão uma série de vezes, mas tem tramitado em ritmo lento. Por que isso ocorre? Após a aprovação da reforma da Previdência, enxergo que as reformas do Brasil são interdependentes. A Previdência dispara uma série de efeitos que vão criar um clima para uma nova ordem federativa entre municípios, estados e União. Isso cria um ambiente propositivo para a aprovação da reforma tributária, uma nova visão sobre a repartição de recursos, a exemplo do que ocorreu na cessão onerosa. Embora tenhamos ouvido falar em reforma tributária nos últimos 30 anos, o ambiente fiscal sempre trouxe um efeito gangorra: cada estado, com sua característica econômica, defendia uma reforma diferente.
A reforma tributária tende a enfrentar menos resistência do que a previdenciária? Acredito que ela tem a vantagem de ser debatida com a atenção diferenciada, porque não terá como concorrência outras reformas centrais. O que muda, para mim, é o ambiente e o tamanho que a reforma pode ter a partir de agora.
O senhor afirma que a reforma tributária não terá outra concorrente, mas, em paralelo se discute a reforma administrativa? Sim, mas acho que se é como se tivéssemos uma fila de informações para a nova ordem federativa. Reforma da previdência, tributária, administrativa. A reforma da Previdência foi o primeiro passo.
O senhor já foi do PSB, PSDB, se elegeu pelo Solidariedade e agora está no MDB. Esse trânsito por partidos antagônicos no espectro político é um trunfo para a articulação? A capacidade de diálogo requer que deixemos de lado a ressaca eleitoral. Nossa atuação será focada em uma questão de perfil: ao invés de um debate externo, um debate interno, próximo às lideranças do Congresso Nacional, com governadores, prefeitos. Essa é, por exemplo, uma característica de Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre.
Parlamentares afirmam que os líderes do governo precisam ser emponderados para colocar em prática acordos firmados com o Congresso. Como quebrar essa resistência do Bolsonaro, a fim de evitar que as negociações sejam tratadas ele como toma-lá dá-cá? O presidente é um brasileiro que, após uma eleição muito acirrada, comemora a aprovação da reforma da Previdência. O governo amadurece com isso, e o presidente demonstra que, no dia a dia, no trato com o Congresso, é um dos mais experientes da história recente. É uma questão de ajuste que o tempo proporciona. O governo vai tendo êxito e o presidente vai moldando sua relação com os líderes. O momento, para mim, é de otimismo na tratativa política.
Há, então, tempo e ambiente para aprovar, ainda em 2019, outra reforma? A aprovação da reforma da Previdência teve um ingrediente fundamental no seu êxito, que foi a condução de Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre, a atenção dada às lideranças, mesmo àquelas que votaram de forma contrária, mas sustentaram o calendário [que foi proposto]. As que não forem aprovadas este ano ficarão encaixadas para a aprovação no 1º semestre do ano que vem.
Como é a sua relação com o presidente Bolsonaro? Fomos colegas por três mandatos [como deputados federais]. O Bolsonaro sempre foi um parlamentar de atuação muito firme, de muitas brigas. Quando fui 1º secretário de Mesa da Câmara dos Deputados, sempre tive dele um tratamento cordial, tranquilo. Enxerguei nele uma luta obstinada, é um parlamentar linha dura que tem muita simpatia da população brasileira e chegou à vitória com uma campanha absolutamente diferente do que estávamos acostumados. Bolsonaro assumiu a Presidência com o país totalmente dividido, mas aprovou a reforma da Previdência em oito meses.
Considerando este cenário de polarização existente, uma eventual soltura de Lula é boa para um governo eleito na esteira do antipetismo? Antes, Bolsonaro respondia por sua campanha. Agora, pelo seu governo, que tem linhas definidas e que busca o desenvolvimento. Qualquer enfrentamento político pensando em uma próxima eleição terá um componente que é a avaliação de seu governo. Acredito que o presidente Bolsonaro esteja pronto para enfrentar qualquer adversário. O PT já é um adversário conhecido.
Mas o embate direto com Lula é uma saída inteligente? A visão de quem governa é reflexo do resultado de seu governo. Isso muda o espaço para debate. Se o governo estiver bem, cumprindo os seus projetos, se a economia estiver numa crescente, a história mostra que o debate ideológico mais ferrenho fica em segundo plano. A população escolhe a estabilidade, o crescimento. Não teremos fácil uma eleição tão acirrada, do ponto de vista ideológico, como foi a passada.
Como foi o convite para assumir a liderança? O presidente me chamou no meio dessa troca de liderança. Eu era vice-líder do governo. A deputada Joice Hasselmann, com quem mantenho uma boa relação, me confiou relatorias, posições de destaque em comissões. Foi uma substituição, como se eu estivesse no banco de reservas.