Operação abrangeu terra Yanomami, favelas e condomínios de luxo
Por Wellton Máximo
Previsto para ser lançado na próxima quarta-feira (28), o Censo 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) esteve a um passo de ser comprometido. A falta de apoio para acesso dos recenseadores a áreas remotas ou carentes e resistência de alguns cidadãos abastecidos por notícias falsas por pouco fizeram o equivalente a quase um estado do Rio de Janeiro deixar de ser contado.
Ao longo dos últimos três meses, sucessivos mutirões do IBGE e do Ministério do Planejamento conseguiram reverter a situação. Uma série de forças-tarefas incluiu, de última hora, 15,9 milhões de brasileiros no censo. Ao todo, foram três operações especiais. A primeira buscou alcançar brasileiros na Terra Indígena Yanomami, que nunca tinham sido recenseados. As outras procuraram reduzir a taxa de não resposta em dois ambientes opostos, mas com resistência a recenseadores: favelas e condomínios de luxo.
“Nesta semana, vamos deixar para trás informações de 13 anos atrás, do Censo de 2010. Para formular políticas públicas, conhecer as demandas da população e atuar em emergências, precisamos de informações atualizadas. O recenseamento é essencial para conhecer quem somos, quantos somos e como somos hoje. Não como éramos”, diz o assessor especial do Ministério do Planejamento, João Villaverde.
Indígenas
Realizado em março, o recenseamento na Terra Indígena Yanomami incluiu 26.854 indígenas no censo, dos quais 16.560 em Roraima e 10.294 no Amazonas. O mutirão foi essencial para atualizar a população indígena no Brasil, estimada em 1,65 milhão de pessoas segundo balanço parcial apresentado em abril. O número completo só será divulgado em julho, quando o IBGE apresentará um balanço específico do Censo 2022 para a população indígena.
A operação na Terra Yanomami foi complexa, mas conseguiu, pela primeira vez na história, recensear 100% da etnia no território. Por envolver dificuldades de acesso a aldeias aonde só se chega de helicóptero, o mutirão foi coordenado por cinco ministérios e reuniu 110 servidores federais dos seguintes órgãos: Polícia Rodoviária Federal, que forneceu os helicópteros; Ministério da Defesa, que forneceu o combustível; guias do Ministério dos Povos Indígenas; servidores da Secretaria de Saúde Indígena da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai); além dos próprios recenseadores do IBGE.
Realizado de 7 a 30 de março, o mutirão foi necessário porque o recenseamento tradicional não conseguia chegar a todas as aldeias yanomami. Por causa das operações para retirar os garimpeiros e do remanejamento de helicópteros para as ações de resgate humanitário, o censo teve de reduzir o ritmo em fevereiro, quando cerca de apenas 50% da população do território havia sido contabilizada.
Favelas
Nas favelas, o censo esbarrava em outras dificuldades. Além da falta de segurança em alguns locais, muitos moradores não queriam abrir a porta para o recenseador porque tinham recebido falsas notícias de que teriam benefícios sociais cancelados. Outro problema, principalmente em áreas mais densas, era a falta de endereços nas comunidades. Muitas vezes, os recenseadores não tinham informação sobre novas moradias surgidas nos últimos anos, como puxadinhos e lajes num mesmo terreno.
“O que impedia a entrada dos recenseadores na favela era a falta de conexão dos recenseadores e do Poder Público com as pessoas que moram lá. Além disso, havia a falta de conscientização das pessoas por falta de uma explicação que alcançasse os moradores das favelas da importância do censo e de respostas sinceras e objetivas”, analisa o Marcus Vinicius Athayde, diretor do Data Favela e da Central Única adas Favelas (Cufa), que auxiliou o IBGE no mutirão.
O mutirão começou no fim de março, com o lançamento de uma campanha na Favela de Heliópolis, em São Paulo, do qual participou a ministra do Planejamento, Simone Tebet. A operação ocorreu em 20 estados e registrou aglomerados subnormais (nomenclatura oficial do IBGE para favelas) em 666 municípios. O número de habitantes só será conhecido em agosto, quando o IBGE divulgará um recorte do Censo 2022 para as favelas.
Segundo Athayde, a Cufa ajudou primeiramente por meio de uma campanha chamada Favela no Mapa, que usou as lideranças estaduais da entidade para conscientizar os moradores de favelas da importância de responder ao censo. Em seguida, a Cufa recrutou moradores de favelas e lideranças locais para atuarem como recenseadores e colherem os dados das comunidades onde moram. Também houve mutirões de respostas em eventos comunitários.
“Responder ao censo traz benefícios de volta para o morador da favela, para seus vizinhos, para sua família, na medida em que o governo e as políticas públicas atuarão de forma mais adequada para essa população”, destaca Athayde.
Condomínios
Por fim, o último flanco de resistência a recenseadores concentrava-se em condomínios de luxo, principalmente em três capitais: São Paulo, Rio de Janeiro e Cuiabá. “Historicamente, a taxa de não resposta, que é o morador que não atende ao recenseador, fica em torno de 5%. Isso em todos os países que fazem censo. Nessas três cidades, a taxa estava em 20% em condomínios de alto padrão”, conta Villaverde, do Ministério do Planejamento.
No Censo 2022, a média nacional de não respostas estava em 2,6% segundo balanço parcial divulgado em janeiro. No estado de São Paulo, alcançava 4,8%, principalmente por causa da recusa de moradores de condomínios de renda elevada.
Para contornar os problemas, o Ministério do Planejamento e o IBGE promoveram uma campanha maciça em redes sociais. Parte das inserções foi direcionada a sensibilizar porteiros, que obedecem a regras restritas para entrada de estranhos. Outra parte esclareceu que síndicos não têm o poder de proibir o morador de receber o IBGE. “Muitas pessoas queriam atender ao censo, mas não sabiam que o recenseador não tinha vindo porque o síndico vetava”, recordou Villaverde. Também houve reportagens de quase 10 minutos em televisões locais sobre o tema.
Segundo o assessor especial do Planejamento, a mobilização foi um sucesso. “Em uma dessas três capitais, conseguimos reduzir a taxa de não resposta para menos de 5% em condomínios de alta renda”, diz. A operação para os condomínios começou em 14 de abril e estendeu-se até 28 de maio, último dia de coleta de dados para o Censo 2022.
Entraves
A realização do Censo 2022 enfrentou diversos entraves. Inicialmente previsto para 2020, o recenseamento foi adiado por causa da pandemia de covid-19. Em 2021, o Supremo Tribunal Federal (STF) obrigou o governo anterior a realizar o censo em 2022.
Na época, o Ministério da Economia autorizou R$ 2,3 bilhões para o censo, mesmo orçamento de 2019 que desconsiderava a inflação acumulada em dois anos. Com a coleta de dados iniciada em 1º de agosto, o Censo 2022 inicialmente estava previsto para encerrar-se em outubro do ano passado. Com dificuldades para a contratação, o pagamento e a manutenção de recenseadores, o fim do censo foi primeiramente adiado para fevereiro deste ano.
Com falta de verba e alta proporção de não recenseados, o governo atual decidiu fazer uma suplementação orçamentária de R$ 259 milhões ao IBGE. O Ministério do Planejamento também decidiu seguir a recomendação do Conselho Consultivo do IBGE, formado por ex-presidentes do órgão, demógrafos e acadêmicos, e estender a coleta de dados até o fim de maio. Em abril, uma série de remanejamentos internos no órgão evitou um novo pedido de verbas pelo IBGE.
Desde 29 de maio, o IBGE está rodando os dados, para a divulgação na próxima quarta-feira. “No início do ano, o ministério tomou a difícil decisão de seguir 100% das recomendações do Conselho Consultivo porque os dados colhidos até então não garantiam a qualidade do censo. Agora, com as operações especiais e o tempo extra de coleta, temos a certeza de que o recenseamento está robusto e em linha com os parâmetros internacionais de qualidade”, diz Villaverde.
Calendário do abono vai até o dia 7 de julho. Pagamento inicia com segurados que ganham um salário mínimo (R$ 1.320)
Com Assessoria do INSS
Aposentados, pensionistas e beneficiários de auxílios do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) começam a receber nesta segunda-feira (26), junto com o benefício normal, a segunda parcela do 13° salário antecipado. O calendário de pagamento segue até o dia 7 de julho.
Os primeiros contemplados com a antecipação do pagamento do abono salárial são os segurados que têm cartão de benefício com final 1 (dígito antes do traço) e que recebem até um salário mínimo (R$ 1.320)
Para quem ganha acima do piso nacional, os créditos serão feitos de 3 a 7 de julho, a começar pelos segurados que têm final de matrícula 1 e 6. A segunda parcela do abono vem com descontos, como o do Imposto de Renda.
Para os benefícios concedidos após o mês de maio de 2023, o pagamento do abono anual será efetuado em parcela única, juntamente com a mensalidade da competência de novembro de 2023.
Calendário da segunda parcela
Quem recebe salário mínimo (R$ 1.320)
Final do benefício 1 – 26/6
Final do benefício 2 – 27/6
Final do benefício 3 – 28/6
Final do benefício 4 – 29/6
Final do benefício 5 – 30/6
Final do benefício 6 – 3/7
Final do benefício 7 – 4/7
Final do benefício 8 – 5/7
Final do benefício 9 – 6/7
Final do benefício 0 – 7/7
Quem recebe acima do salário mínimo
Final do benefício 1 e 6 – 3/7
Final do benefício 2 e 7 – 4/7
Final do benefício 3 e 8 – 5/7
Final do benefício 4 e 9 – 6/7
Final do benefício 5 e 0 – 7/7
Como consultar
O extrato já está disponível no site do instituto ou no aplicativo Meu INSS. A consulta e a impressão do documento podem ser feitas pela internet, no site da instituição. O processo é simples: basta acessar a página meu.inss.gov.br e utilizar a senha de acesso ao sistema.
Quem tem direito
Recebem o abono os beneficiários de aposentadoria, auxílio-doença, auxílio-acidente, auxílio-reclusão, pensão por morte e outros auxílios administrados pelo instituto.
Os segurados do Benefício de Prestação Continuada (BPC/Loas) — pago a idosos de baixa renda acima de 65 anos e a pessoas carentes com deficiência, equivalente a um salário mínimo — e da Renda Mensal Vitalícia — mantida apenas para aqueles que já eram beneficiários até dezembro de 1995 — não recebem o 13° salário.
Antecipação
Nos últimos três anos, em 2020, 2021 e 2022, o 13º salário também foi antecipado, como uma ação para minimizar os impactos provocados pela pandemia do novo coronavírus. Normalmente, o abono é pago no segundo semestre do ano, em agosto e novembro.
A medida vai beneficiar mais de 30 milhões de segurados, com um total de R$ 62,6 bilhões.
O piso nacional atual de R$ 1.320 é o valor mínimo para aposentadorias, pensões por morte e auxílio-doença em 2023. Já o teto do INSS, que estabelece o valor máximo de qualquer benefício pago pelo instituto, é de R$ 7.507,49.
A antecipação do benefício alcança todos os estados brasileiros e representa uma injeção de recursos nos mercados locais.
São Paulo é o estado que receberá o maior repasse para pagamento do abono anual, levando em conta os dois meses de pagamento. Serão R$ 17,7 bilhões em recursos. Na sequência aparece Minas Gerais, com R$ 6,9 bilhões em repasses, seguido por Rio de Janeiro (R$ 6 bilhões), Rio Grande do Sul (R$ 5 bilhões), Paraná (R$ 3,67 bilhões) e Bahia (R$ 3,6 bilhões).
Entre os principais pontos de discussão está a criação do Fundo de Desenvolvimento Regional
Por Agência Brasil
O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), disse nesta quinta-feira (22) que a proposta de reforma tributária deve ser analisada na primeira semana de julho pelo plenário da Casa. O texto da proposta foi discutido pela manhã com governadores e outros representantes dos 26 estados e do Distrito Federal.
“O texto será disponibilizado para que todos possam criticar, e não será o que vai ser votado. Na reunião foram feitas sugestões e eu entendo que serão acomodadas diante do texto. É um tema complexo, e o momento é agora e temos a obrigação de entregar a melhor reforma”, afirmou o parlamentar. De acordo com Lira, o relator da proposta, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), apresentará o texto da reforma ainda nesta semana.
Fundo de Desenvolvimento Regional
Entre os principais pontos de discussão está a criação do Fundo de Desenvolvimento Regional. A medida permitiria aos estados reduzir alíquotas do imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) para atrair investimentos.
Segundo o governador de Goiás, Ronaldo Caiado, o dispositivo seria uma forma de compensar a arrecadação de estados produtores, como os do Centro-Oeste e do Norte. Em outra frente, o fundo poderia destinar recursos para os estados consumidores, que atualmente concedem benefícios fiscais.
“Como estados que não têm estrutura de outros poderão crescer? Precisamos de outra política para termos capacidade de crescimento”, defendeu Caiado, após o encontro.
A proposta em discussão prevê a criação do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS). O tributo substituiria duas contribuições – o Programa de Integração Social (PIS) e a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) – e três impostos – o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), o Imposto sobre Serviços (ISS) e o ICMS.
Atualmente, as contribuições ficam inteiramente com a União. O IPI é partilhado entre União e governos locais, o ICMS fica com os estados; e o ISS, com os municípios.
Itens de luxo foram doados por Mohammed Bin Salman em 2021 e seriam um presente para a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro
Com informações da Agência Estado
Um dia depois de ter cancelado o jantar com o príncipe herdeiro da Arábia Saudita, Mohammed Bin Salman Al Saud, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) disse que vai orientar o Itamaraty a convidá-lo para visitar o Brasil. Eles se encontrariam numa residência de luxo próxima a Paris para um banquete oferecido pelo saudita. De última hora, no entanto, o petista desistiu de ir.
Ao justificar a desistência, Lula repetiu neste sábado (24) o argumento oficial da Presidência da República. A assessoria dele informou que o motivo era o desgaste físico do presidente por causa da sequência de compromissos na capital francesa.
"Eu sabia que havia uma proposta de reunião com o príncipe da Arábia Saudita, que queria discutir investimentos no Brasil. Quero conversar com todas as pessoas que querem fazer investimento no Brasil, porque quero saber qual a qualidade do investimento", disse Lula em uma entrevista à imprensa antes de decolar de volta para o Brasil.
"Não tive condições de participar da reunião e vou pedir que o Itamaraty o convoque para ir ao Brasil discutir negócios com empresários brasileiros. Se a Arábia Saudita tiver interesse em investir, o Brasil terá interesse em conversar com quem quer que seja que eles mandem conversar", afirmou.
Lula negou que outro tipo de desgaste — como a repercussão negativa do encontro nas redes sociais e na política nacional — tivesse levado ao cancelamento. Integrantes da comitiva presidencial, porém, sabiam do custo político e temiam que o jantar associasse Lula a um autocrata cujo regime oprime mulheres e que foi acusado de mandar matar um jornalista.
Joias sauditas
Além disso, foi Bin Salman quem mandou presentear o ex-presidente Jair Bolsonaro e a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro com joias milionárias, que não foram declaradas à Receita Federal. Eles se tornaram alvo de uma investigação. "Sinceramente, não pensei nisso. Não estou preocupado com joias, isso não é comigo", disse Lula.
A ideia do encontro teria partido dos sauditas, segundo diplomatas, e, embora não estivesse prevista na agenda inicial da viagem de Lula, a reunião foi incluída oficialmente como compromisso do presidente e, depois, retirada.
O TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo) começou a aplicar decisão do STJ (Superior Tribunal de Justiça) e tem determinado a penhora de salário e aposentadoria do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) para o pagamento de dívidas.
POR CRISTIANE GERCINA
Em abril, o Tribunal Superior decidiu que salários de qualquer valor podem ser penhorados para quitar débitos. Antes, a penhora valia apenas para renda acima de 50 salários mínimos (R$ 66 mil atualmente).
Em ao menos três decisões às quais a Folha teve acesso os desembargadores determinaram percentuais do rendimento salarial ou da aposentadoria que podem ser penhorados, que variam entre 10% e 15%, mas podem chegar a 30% da renda.
Em um dos casos, os desembargadores confirmaram o desconto de 30% sobre a aposentadoria do trabalhador, condenado por improbidade administrativa. O entendimento foi de que a subsistência da família não seria afetada, já que o cidadão continuaria a receber 70% da renda do INSS.
Além disso, a pessoa que foi processada tinha outros empregos. Um deles como técnico de raio-X em hospital no interior do estado de São Paulo, e ainda recebia outro benefício pago pela SPPrev (São Paulo Previdência). A renda líquida do profissional oscilava entre R$ 5.000 e R$ 8.000 mensais, diz parte do processo.
O desembargador responsável pelo caso determinou que o INSS fosse comunicado para realizar o desconto de 30% diretamente na folha de pagamento do benefício e depositar o valor em uma conta judicial. "O desconto perdurará até o pagamento integral do débito", diz a decisão.
O advogado Antonio Nachif, especialista em resolução de conflitos do escritório Dias Carneiro Advogados, diz que o entendimento do STJ que permite a penhora não é válido apenas para os salários pagos em contratos com carteira assinada, ou seja, pela CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) e pode ser aplicado sobre a renda de trabalho autônomo, assim como sobre as aposentadorias.
O especialista explica ainda que é preciso, antes, buscar por outros bens penhoráveis, além de garantir os princípios constitucionais da razoabilidade e da proporcionalidade para não comprometer a sobrevivência de quem é processado. "Se você tem uma forma menos grave de penhorar, tem que seguir essa forma", afirma.
"Tem que ser uma proporção do salário de modo que a pessoa consiga viver, um percentual que se apura caso a caso", diz ele.
A advogada Adriane Bramante, presidente do IBDP (Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário), afirma que as decisões do TJ estão na linha do que determina o Tribunal Superior. Segundo ela, em um dos casos que atendeu, o cliente teve a aposentadoria do INSS penhorada para pagar uma dívida trabalhista jurídica de sua empresa.
"Se o STJ decidiu que pode penhorar de qualquer pessoa, qualquer que seja a natureza do salário, isso inclui também benefício previdenciário", diz.
Para Adriane, a Justiça precisa analisar cada caso, conforme a renda do aposentado e suas condições de sobrevivência. "Tem que ser analisada a situação individualizada, porque pode ser que a pessoa só tenha como renda a aposentadoria, não tenha outra fonte, e o desconto no benefício para pagar dívida pode ter consequências na subsistência da família."
Rômulo Saraiva, advogado especializado em Previdência e colunista da Folha, afirma que está havendo uma movimentação da Justiça para acabar com os efeitos da chamada impenhorabilidade absoluta dos salários, que impede a penhora desse tipo de rendimento até determinado valor.
Segundo ele, em Pernambuco, onde atua, decisões judiciais também têm seguido o STJ e determinado penhora de aposentadorias. "Hoje os credores têm conseguido sucesso -em decisões cada vez mais comuns Brasil afora- em penhoras de 10% a 30% dos valores de aposentadoria."
"Eu entendo que essa possibilidade de penhora deve ser vista com parcimônia", afirma.
A análise caso a caso tem sido feita pelo TJ-SP. Em outra decisão, os desembargadores negaram a penhora de qualquer percentual de aposentadoria de uma segurada do INSS que recebia dois salários mínimos. O pedido de penhora havia sido feito por uma empresa de móveis devido a uma dívida de R$ 6.000.
Nachif afirma que o cidadão precisa se defender no processo, provando que terá dificuldades de subsistência.
OUTROS CASOS
Em uma das decisões, de 17 de maio, a Câmara de Direito Privado do TJ-SP aceitou parte do recurso do devedor e reduziu a penhora de 30% para 10% da renda bruta.
"O percentual postulado pela agravante é excessivo [30%]. É mais factível estabelecer a penhora em 10% sobre a remuneração bruta, visto que, certamente, o saldo líquido da remuneração do agravado ficaria prejudicado para fins de sobrevivência caso deferido o abocanhamento de tamanha fatia de seus rendimentos [30%]", diz trecho da decisão.
Em um outro processo, o órgão também diminuiu a fatia a ser penhorada de 30% para 15%. No entendimento dos desembargadores, diminuir o percentual atende aos princípios constitucionais da razoabilidade e da proporcionalidade, sem prejudicar a subsistência do devedor, tratando-se de "percentual modesto e que não prejudica a sua subsistência".
No caso julgado, o trabalhador exerce o cargo de assessor parlamentar, com salário líquido mensal de R$ 12.091,95. O profissional já havia tido bloqueio parcial de outros valores pela dívida, que chega a R$ 272 mil.
ESTUDANTE TEM CONTAS BLOQUEADAS POR DÍVIDA COM FACULDADE
Uma dívida com a faculdade após ser bolsista da pós-graduação da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo) levou a revisora de textos Luciana Mendonça, 44 anos, a ter suas contas bloqueadas por determinação da Justiça.
Luciana ingressou na PUC em 2017 para cursar mestrado. Na ocasião, conseguiu bolsa da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) de R$ 1.500, que era repassada integralmente para a PUC. O restante era custeado pela universidade.
"Eu tinha 24 meses para terminar o curso, período de validade da bolsa. Se eu precisasse de mais tempo para finalizar o curso, deveria arcar integralmente com os valores. Foi o que aconteceu, não terminei a tempo e ficou faltando pagar duas mensalidades no semestre", diz.
Hoje, essa dívida está em R$ 24 mil e, no início de junho, a profissional recebeu a informação de que valores depositados em sua conta jurídica de MEI (Microempreendedor Individual) serão bloqueados. Em março de 2022, no entanto, R$ 500 que estavam em uma conta-poupança foram bloqueados para pagar a dívida.
"Em março do ano passado, fiquei desempregada. Tinha acabado de receber o salário da empresa que fui demitida. Os R$ 500 que havia em uma conta-poupança para pagar dívida e remédios de uso controlado foram bloqueados. Recorri à Defensoria Pública, que pediu a devolução desse dinheiro, mas não conseguimos", afirma.
Segundo ela, a PUC chegou a procurá-la para fazer acordo, mas por trabalhar como pessoa jurídica, não havia condições. "Estou sempre em vaivém de empregos. Hoje, o que posso pagar são R$ 350 por mês."
Para sobreviver, tem recebido os rendimentos pelos serviços prestados em uma conta de uma amiga. "Estou usando a conta de uma amiga, mas a vida financeira hoje é quase toda digital, o que vem causando muitos transtornos. Não poder usar uma conta porque tem medo de não conseguir se manter por uma dívida estudantil é extremamente humilhante."
A assistente social Priscila Santos Silva, 41, contou com bolsa da PUC-SP na faculdade. Ela tinha desconto de 30% e pagava R$ 498 de mensalidade entre 2003, quando ingressou, e 2009, quando concluiu a graduação.
A profissional não teve contas bloqueadas, mas recebeu recentemente o aviso de que os bens terão bloqueio. Em seu caso, o processo foi aberto contra o pai, fiador do contrato, que já morreu. Segundo ela, todas as tentativas de acordo foram ineficazes. "Houve proposta de pagamento sem os juros, que não foi aceito." A dívida hoje está em R$ 130 mil.
Em nota, a PUC afirma que oferece bolsas de estudo integrais e parciais em todos os cursos. Hoje, 22% dos alunos são bolsistas na cota de filantropia. A universidade diz ainda que os estudantes com débitos contam com o núcleo de conciliação e cobrança no qual os estudantes, "dentro de critérios financeiros e acadêmicos", podem negociar.
Segundo a instituição, ações de cobrança são propostas como último recurso, "por dever de ofício", e sempre há audiências em que se tenta a conciliação. O percentual dos que têm o pedido de penhora de bens chega a 3%, afirma. "Boa parte deles só procurou a instituição após o juiz ter determinado a penhora", diz a nota.