Ministros do governo e aliados do presidente Lula (PT) no Congresso veem com apreensão uma eventual prisão de Jair Bolsonaro (PL) em decorrência do avanço das investigações contra o ex-presidente.
Por Julia Chaib
O cenário em que Bolsonaro poderia ser preso atiçou a militância petista, e movimentos sociais ligados ao governo pretendem incorporar o pedido de prisão de Bolsonaro no rol de reivindicações das manifestações no 7 de Setembro.
Apesar disso, integrantes do governo e articuladores políticos dizem torcer para que uma prisão, caso ocorra, seja em cumprimento a uma solicitação do Ministério Público Federal e com robustez de provas.
Isso porque a eventual detenção de Bolsonaro poderia contribuir para inflamar e dividir mais a sociedade, avaliam.
O ex-presidente está no centro de apurações que apontam a existência ao seu redor, e com o seu estímulo, de um grupo que alimentava reais expectativas de aplicar um golpe de Estado e barrar a posse do presidente eleito em 1º de janeiro.
No decorrer dessas apurações, veio a público também indícios de tentativa de vender no exterior presentes que o ex-mandatário havia recebido em visitas oficiais a países do Oriente Médio.
Apesar de todas essas apurações, um parlamentar muito próximo de Lula cita a própria anulação das acusações contra o petista e a posterior absolvição de Dilma Rousseff (PT) em processos como exemplos do que pode vir a ocorrer com Bolsonaro.
Este congressista lembra que muitos petistas foram alvos de investigação e avalia que essa onda de decisões precipitadas e que ele considera arbitrárias tem que acabar
Mais dois ministros ouvidos sob reserva avaliam ser necessário ter maiores evidências antes que seja tomada uma medida desta, já que a prisão do ex-presidente poderia, em vez de enfraquecê-lo politicamente, contribuir para inflar seus apoiadores.
Eles lembram que Lula, mesmo preso, conseguiu articular a candidatura de Fernando Haddad (PT) no seu lugar e levou o aliado a ficar em segundo lugar na disputa presidencial de 2018.
Nesta sexta (25), em entrevista ao UOL, o diretor-geral da PF, Andrei Rodrigues, afirmou que os investigadores devem se pautar na lei, na apuração, na "responsabilidade e na qualidade da prova" e que Bolsonaro pode ser preso se os requisitos forem atendidos.
"Se nessa conjunção de elementos se chegar a essa conclusão [pela prisão], se os requisitos legais são atendidos, esse é um caminho possível, e aqui falo hipoteticamente", disse o diretor da PF.
Na última semana, o ministro Flávio Dino (Justiça) também afirmou que as investigações contra o ex-presidente são conduzidas de forma séria, isenta e técnica. Afirmou ainda que as apurações estão longe do fim.
"Cabe a mim garantir ao povo brasileiro, especialmente à população de Minas Gerais, que a investigação é técnica, séria, isenta e está sendo bem conduzida. Bem conduzida no sentido de não haver interferência externa, nem no sentido de perseguições, nem no sentido de haver proteções", disse o ministro na última segunda-feira (21), ao ser questionado sobre a possibilidade de o ex-presidente ser preso.
O ministro admitiu a possibilidade de o passaporte de Bolsonaro ser apreendido, mas afirmou que, por enquanto, essa solicitação ainda não foi feita à Justiça. "Não antecipo investigação, não presido investigação. O que posso falar é que legalmente é possível. Nesse momento ainda não houve esse pedido", afirmou.
Em outra frente, os aliados de Bolsonaro querem usar as acusações para tentar transformá-lo em uma espécie de mártir.
O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) aposta que a sociedade enxerga o que ele classifica como perseguição ao pai.
"A perseguição [a Bolsonaro] faz com que a população fique mais simpática a ele. Pesquisas mostram que ele continua forte e que o apoio dele para eleição de 2024 vai ser decisivo", diz o filho mais velho do ex-presidente.
Essas afirmações são contestadas pelo entorno de Lula, que afirma que o ex-presidente tem sofrido uma erosão em seu apoio devido às investigações.
Bolsonaro despencou em relevância nas redes após a operação da PF no caso das joias e as declarações de Walter Delgatti Netto, conhecido como hacker da Vaza Jato, de acordo com o IPD (Índice de Popularidade Digital), analisado diariamente pela empresa de pesquisa e consultoria Quaest.
A leitura de aliados de Bolsonaro, entretanto, é que, como o ex-presidente já está inelegível, o avanço uma uma investigação manca vai passar a imagem de que a Polícia Federal, o STF e o Ministério da Justiça conduzem um processo político.
Essas pessoas acham que é o caso especialmente da investigação do envio de mensagem que sugeria, sem provas, uma fraude do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
Bolsonaro confirmou na quarta (23) o teor da mensagem enviada ao empresário Meyer Nigri que levou a Polícia Federal a intimar o ex-presidente para explicar a difusão de fake news sobre o processo eleitoral brasileiro. "Eu mandei para o Meyer, qual o problema?", disse à Folha.
Um dos casos mais delicados até agora é a apuração sobre as joias e presentes dados por autoridades de outros países ao ex-mandatário. Ao autorizar diligências no processo, o ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), apontou investigação de possível cometimento de crimes de peculato e de lavagem de dinheiro.
Aliados do ex-presidente dizem que, com o tempo, a população vai interpretar o episódio como uma falha causada por uma legislação capenga, que inclusive deverá ser refeita pelo Congresso, mostrando que havia inconsistências.
Flávio Bolsonaro afirmou que, como resultado dessas investigações, o ex-presidente terá ainda mais poder de transferência de votos.
O discurso de vitimismo, portanto, tem sido a principal aposta do entorno do ex-presidente desde que denúncias e acusações contra ele passaram a ficar mais claras.
Certame unificado para cerca de 8.000 vagas de 50 órgãos federais está previsto para acontecer em fevereiro de 2024
Com Agências e R 7
O governo federal pretende unificar os concursos públicos no país, como ocorre com o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio).
A proposta apresentada pelo Ministério da Gestão e Inovação é que seja feito um único certame para preencher cerca de 8.000 vagas abertas no serviço federal, de cerca de 50 órgãos.
Com uma prova a ser realizada no mesmo dia em 180 cidades do país, em fevereiro de 2024.
Segundo o secretário de gestão de pessoas do ministério, José Celso Cardoso Jr., a adesão dos ministérios ao chamado Concurso Nacional Unificado será voluntária.
O edital deverá ser publicado até dezembro, com realização de prova prevista para o dia 25 de fevereiro de 2024, dividida em dois tipos no mesmo dia: objetivas com matriz comum a todos os candidatos e específicas e dissertativas por blocos temáticos.
Os resultados gerais da primeira fase devem ser divulgados até o final de abril de 2024 e o início dos cursos de formação, entre junho e julho do ano que vem.
"Com isso, criamos um critério de justiça de acesso às vagas públicas como nunca ocorreu antes na história do Brasil”, afirmou Cardoso Jr. Segundo ele, estudos indicam que esse formato unificado de provas tem sido capaz de selecionar melhor os futuros servidores.
O certame será organizado a partir de uma coordenação geral composta pelo Ministério da Gestão e da Inovação, o Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), o Ipea (Instituto de Pesquisa Econômico Aplicada), a Enap (Escola Nacional de Administração Pública) e a AGU (Advocacia Geral da União).
Segundo o Ministério da Gestão, até meados de setembro deste ano, deve ser publicado o ato oficial que irá definir a estrutura de governança do concurso federal unificado.
Veja a lista dos concursos autorizados em 2023
Pelo governo federal
• Ministério das Relações Exteriores
- Diplomata — 50
- Oficial de chancelaria — 50
• Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação
- Unidade central + 16 vinculadas: CBPF, CTI, Cetem, Cetene, Demaden, IBICT, INMA, Inpa, Inpe, INT, INSA, LNA, LNCC, MAST, MPEG, ON) — 814
• CNPQ — 50
• Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima — 98
• Funai — 502
• Ministério da Agricultura — 440
• Inmet — 80
• Censipam — 50
• Incra — 742
• Inmetro — 100
• Inpi — 120
• Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (ACE) — 50
• Ministério da Educação — 220
• Capes — 50
• FNDE — 100
• Inep — 50
• Ministério de Minas e Energia — 30
• Ministério da Saúde — 220
• Fiocruz — 300
• Ministério do Trabalho e Emprego (auditor fiscal do trabalho) - 900
• DNIT — 100
• Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (carreira transversal - analista de Infraestrutura) — 300
• Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (carreira transversal - analista em tecnologia da informação) — 300
• Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (analista técnico de políticas sociais) — 500
• Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (carreira transversal - especialista em políticas públicas e gestão governamental) — 150
• Bacen (Banco Central) — 100
• Ministério da Fazenda (auditor federal de finanças e controle) — 40
• Ministério da Fazenda (Comissão de Valores Monetário) — 60
• Ministério do Planejamento e Orçamento
- Analista de Planejamento e Orçamento (IBGE) — 895
• Ministério da Justiça e Segurança Pública
- Plano Geral de Cargos do Poder Executivo — 100
• Agências
• Aneel — 40
• ANS — 35
• Anac — 70
• Antaq — 30
• Anvisa — 50
• ANA — 40
• ANTT — 50
Além dos números acima, outros 4 concursos já tiveram a autorização anunciada: Previc, MPO, Ipea, Anatel e Anvisa.
Para Rafael Velasco, diferenciação objetiva entre usuários e traficantes terá impacto direto no resultado das audiências de custódia
Por Gabriela Coelho
A depender do que ficar decidido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento da ação que questiona a criminalização do porte de drogas para uso pessoal, haverá impacto no número de presos e nas audiências de custódia realizadas pelo Judiciário. A análise é do secretário nacional de Políticas Penais do Ministério da Justiça e Segurança Pública, Rafael Velasco.
Segundo Velasco, evitar a entrada no sistema prisional de indivíduos enquadrados como usuários é crucial não apenas para mitigar a superlotação, mas também para proteger esses indivíduos de possíveis associações com facções criminosas.
De acordo com o secretário, a decisão do STF sobre o assunto terá ainda implicações significativas em diversos aspectos do sistema de Justiça criminal. "Uma vez finalizada a votação, será possível determinar com mais precisão o número de detentos que poderão ser reconhecidos como usuários de Cannabis [maconha] e, assim, distingui-los daqueles envolvidos no tráfico de drogas. Esse esclarecimento facilitará o processo de triagem e alocação adequada no sistema prisional", afirmou.
Iniciativa apoia projetos, estudos e empreendimentos voltados à redução da emissões de gases de efeito estufa
Por Plínio Aguiar, do R7
O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) relançou, nesta quinta-feira (24), o Fundo Nacional sobre Mudança do Clima. A iniciativa visa reunir recursos para apoiar projetos, estudos e empreendimentos voltados à redução de emissões de gases de efeito estufa e à adaptação aos efeitos climáticos. O projeto, que tem como meta a captação de R$ 10 bilhões, é operado pelo Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
Criado por lei em 2009, o Fundo Clima disponibiliza recursos em duas modalidades: reembolsável e não reembolsável. Os recursos reembolsáveis são administrados pelo BNDES e os não reembolsáveis são operados pelo Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima.
O Fundo Clima possui nove subprogramas. São eles: Mobilidade Urbana, Cidades Sustentáveis e Mudança do Clima, Máquinas e Equipamentos Eficientes, Energias Renováveis, Resíduos Sólidos, Carvão Vegetal, Florestas Nativas, Gestão e Serviços de Carbono e Projetos Inovadores.
O comitê do mecanismo autoriza o financiamento de projetos e recomenda a contratação de estudos com base em diretrizes e prioridades de investimento estabelecidas a cada dois anos. Um dos pilares é apoiar a implantação de empreendimentos, a aquisição de máquinas, de equipamentos e o desenvolvimento tecnológico relacionado ao tema.
Grupo ganhou importância geopolítica em meio às tensões entre China e EUA e à guerra na Ucrânia. Em relação ao tamanho econômico, Brasil tem uma influência desproporcional – mas a China é quem manda no grêmio.Fazia tempo que um encontro do Brics não chamava tanta atenção quanto este 15º, transcorrido esta semana em Joanesburgo. Representantes de 40 países compareceram, segundo os relatos: além dos cinco membros – Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul –, dezenas de outros que aspiram a ingressar. E ainda os países africanos convidados pelo anfitrião.
Por Alexander Busch*
A atenção dispensada deve-se sobretudo ao fato de o Brics, sob a liderança – daria para dizer também a pressão – da China, estar se transformando cada vez mais num fórum antiocidental. Se depender de Pequim, o Brics deverá se tornar um fórum institucional antagônico ao G7, dominado pelas democracias ocidentais.
Diante das tensões geopolíticas entre a China e os Estados Unidos, mas também do ataque da Rússia à Ucrânia, é importante para a Europa e para os Estados Unidos observar como o Sul Global se posiciona no Brics.
Pois o grupo dos países do Brics está diante de uma nova fase de desenvolvimento. Eles são cada vez menos o clube dos países de crescimento econômico acelerado. É verdade que o percentual do grupo no PIB mundial passou de 8% para 26% desde 2001, quando o banco de investimento Goldman Sachs criou a sigla – então ainda BRIC, sem o S da África do Sul – para um fundo de investimento.
Só que esse sucesso econômico se deveu sobretudo à China, que produz hoje mais do que as quatro outras economias da sigla somadas.
Se Brasil, Rússia e África do Sul cresceram, em média, menos de 1% nos últimos dez anos, China e Índia cresceram em média 6% ao ano.
Assim, o novo tema que une os países do Brics é a transformação global: os governos do grupo exigem nada menos do que uma nova ordem global num mundo "pós-ocidental".
É essa nova narrativa que une esse grupo heterogêneo: a China, como potência global emergente, quer reunir o maior número possível de países em torno de si para criar um polo antagônico aos Estados Unidos. A Rússia pode, com o Brics, contornar seu isolamento internacional depois do seu ataque à Ucrânia. Já para a Índia, o Brasil e a África do Sul – e também para outros países interessados – o formato oferece a possibilidade de se apresentar como neutro num mundo geopoliticamente dividido.
Mesmo assim, os demais países-membros, exceto a isolada Rússia, não fazem automaticamente causa comum com a China. Eles são globalmente conectados, tanto política como economicamente, e não querem nem arriscar suas relações com o Ocidente nem trocar estas por uma dependência da China.
Por isso esses três países se opuseram, em Joanesburgo, à admissão de novos membros. Concordaram apenas em estabelecer diretrizes e princípios para a expansão do bloco. Com isso, esses três países ganham tempo para tentar controlar o processo. Um grupo maior reduziria a importância política deles.
Pois, na verdade, no Brics, sobretudo Brasil e África do Sul estão jogando numa liga muito elevada se for levado em conta o tamanho das economias. Se países ricos, como a Arábia Saudita, ou grandes, como a Indonésia, forem aceitos, então os dois países-membros menores claramente perderiam influência.
Também por isso novos membros deverão ser aceitos apenas com direito restrito de voto no Novo Banco de Desenvolvimento (NDB), como é chamado o banco de desenvolvimento do Brics.
Mas a China conseguiu o que queria: Irã, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Egito, Etiópia e Argentina vão aderir ao grupo a partir do início de 2024.
Assim, a China mostrou que é quem manda no Brics. Conclusão: o Sul Global também terá de se habituar ao fato de que, entre eles, uma potência mundial é quem dá as cartas.
*Há mais de 30 anos, o jornalista Alexander Busch é correspondente de América do Sul. Ele trabalha para o Handelsblatt e o jornal Neue Zürcher Zeitung. Nascido em 1963, cresceu na Venezuela e estudou economia e política em Colônia e em Buenos Aires. Busch vive e trabalha em Salvador. É autor de vários livros sobre o Brasil.