A notícia de que a inflação no país fechou o ano de 2021 em 10,06% é o sinal mais claro do fracasso do governo na área econômica. O número é o maior dos últimos seis anos e representa quase o dobro do teto da meta, que era de 5,25%.
Matheus Leitão –Revista Veja
Em um ano eleitoral, esses números vão impactar diretamente os planos do presidente Jair Bolsonaro de se reeleger. Num cenário que já é desfavorável, ele deve perder ainda mais votos porque não conseguiu tornar a vida do brasileiro menos difícil financeiramente.
Em 2021, testemunhamos um governo que não conseguiu administrar a economia e nem se antecipar aos problemas. Enquanto o ministro da Economia, Paulo Guedes, viveu numa realidade paralela onde a economia vai muito bem e os inimigos do governo é que são muito pessimistas, o Banco Central lutou sozinho para tentar conter a inflação usando um remédio amargo. Nem mesmo o aumento da taxa de juros foi suficiente para conter os números.
Agora, o BC vai ter que explicar por que sua política monetária não funcionou. Se for bem honesto, o presidente do banco pode dizer que trabalhou sozinho e, por isso, não teve sucesso nas suas estratégias.
Além da questão econômica, os 10,06% têm um peso político. Inflação alta sempre traz queda de popularidade, afinal o brasileiro vivencia todos os dias a perda do seu poder de compra e descobre que seu dinheiro não está valendo (quase) nada.
Um dos responsáveis pela inflação alta foi o combustível, que acumulou alta de mais de 40% no ano passado e afeta tanto a classe média como os mais pobres, já que também altera o preço das passagens de ônibus, por exemplo.
O prejuízo político não para por aí. A inflação alta também afasta aliados, já que ninguém quer defender um governo quando ouve da população que o custo de vida está muito alto.
Uma ida ao supermercado é suficiente para saber que os preços subiram. O brasileiro sabe disso e vai cobrar de seus representantes uma mudança de postura.
No centro de tudo isso, cabe destacar também a disparada do dólar. A instabilidade e as crises institucionais criadas pelo presidente Bolsonaro (um dos tiros que ele deu no próprio pé) impactam diretamente a cotação do dólar que, por sua vez, mexe com os preços de diversos itens, incluindo os combustíveis.
É fato que o governo não pode alterar diretamente o preço da gasolina, por exemplo, mas garantir o mínimo de estabilidade seria suficiente para tentar segurar o dólar e, com isso, reduzir os estragos nos combustíveis.
A inflação não é apenas um tema econômico. A estabilidade política do país é importante para manter o equilíbrio em todos os setores. Por isso, é fácil descobrir o motivo do descontrole que estamos vivendo. Com um discurso antivacina, negando a ciência e atacando as instituições, Bolsonaro é responsável não só pelos 10,06% de inflação, mas pelo fracasso da economia como um todo.
ARTIGO
Por Paulo Brondi - Promotor de Justiça/GO*
Da Coluna de Juca Kfouri
"Bolsonaro é um cafajeste. Não há outro adjetivo que se lhe ajuste melhor.
Cafajestes são também seus filhos, decrépitos e ignorantes. Cafajeste é também a maioria que o rodeia.
Porém, não é só. E algo que se constata é pior. Fossem esses os únicos cafajestes, o problema seria menor.
Mas, quantos outros cafajestes não há neste país que veem em Bolsonaro sua imagem e semelhança?
Aquele tio idiota do churrasco, aquele vizinho pilantra, o amigo moralista e picareta, o companheiro de trabalho sem-vergonha…
Bolsonaro, e não era segredo pra ninguém, reflete à perfeição aquele lado mequetrefe da sociedade.
Sua eleição tirou do armário as criaturas mais escrotas, habitués do esgoto, que comumente rastejam às ocultas, longe dos olhos das gentes.
Bolsonaro não é o criador, é tão apenas a criatura dessa escrotidão, que hoje representa não pela força, não pelo golpe, mas, pasmem, pelo voto direto. Não é, portanto, um sátrapa, no sentido primeiro do termo.
Em 2018 o embate final não foi entre dois lados da mesma moeda. Foi, sim, entre civilização e barbárie. A barbárie venceu. 57 milhões de brasileiros a colocaram na banqueta do poder.
Elementar, pois, a lição de Marx, sempre atual: "não basta dizer que sua nação foi surpreendida. Não se perdoa a uma nação o momento de desatenção em que o primeiro aventureiro conseguiu violentá-la".
Muitos se arrependeram, é verdade. No entanto, é mais verdadeiro que a grande maioria desse eleitorado ainda vibra a cada frase estúpida, cretina e vagabunda do imbecil-mor.
Bolsonaro não é "avis rara" da canalhice. Como ele, há toneladas Brasil afora.
A claque bolsonarista, à semelhança dos "dezembristas" de Luís Bonaparte, é aquela trupe de "lazzaroni", muitos socialmente desajustados, aquela "coterie" que aplaude os vitupérios, as estultices do seu "mito". Gente da elite, da classe média, do lumpemproletariado.
Autodenominam-se "politicamente incorretos". Nada. É só engenharia gramatical para "gourmetizar" o cretino.
Jair Messias é um "macho" de meia tigela. É frágil, quebradiço, fugidio. Nada tem em si de masculino. É um afetado inseguro de si próprio.
E, como ele, há também outras toneladas por aí.
O bolsonarismo reuniu diante de si um apanhado de fracassados, de marginais, de seres vazios de espírito, uma patuléia cuja existência carecia até então de algum significado útil. Uma gentalha ressentida, apodrecida, sem voz, que encontrou, agora, seu representante perfeito.
O bolsonarismo ousou voar alto, mas o tombo poderá ser infinitamente mais doloroso, cedo ou tarde.
Nem todo bolsonarista é canalha, mas todo canalha é bolsonarista.
Jair Messias Bolsonaro é a parte podre de um país adoecido."
*Paulo Brondi é Promotor de Justiça em Jataí, Goiás
O anúncio de uma chapa Lula-Alckmin surgiu como um balão de ensaio em círculos petistas e virou um projeto concreto para as eleições de 2022. Para o ex-presidente, é fácil entender os ganhos com a união heterodoxa.
Por Marcos Strecker
Um dos maiores problemas de Lula é se vender como moderado, de centro, fugindo da marca de polarização e extremismo que o PT conquistou antes de “fazer um pacto com o mercado” em 2002 e durante a crise que levou ao colapso dos 13 anos de governo petista. Lula sabe que precisará romper a barreira dos 30% de simpatizantes que sua legenda tem historicamente desde os anos 1980. E é preciso um fato novo para desviar a atenção sobre a complicada herança do Petrolão, do Mensalão e da recessão patrocinada por Dilma Rousseff.
Para Alckmin, o arranjo é bem mais arriscado. O ex-governador teve um desempenho sofrível na eleição presidencial de 2018, quando ficou em quarto lugar com cerca de 5% dos votos. Não ficou isolado apenas dentro do PSDB. Esse desempenho colocou o próprio partido em xeque, sem voz e vez no cenário nacional. No Congresso, os próprios tucanos reconhecem que a legenda se transformou em um braço do bolsonarismo, com caciques que fogem dos holofotes e de investigações constrangedoras e parlamentares em busca de verbas secretas e benesses paroquiais.
A melhor chance de renascimento da legenda é resgatar as realizações que fizeram o partido conquistar a Presidência em dois mandatos: ênfase em programas sociais e modernização do Estado. Os fundamentos do Plano Real, que fizeram o País crescer e até hoje são referência para todo o espectro político, foram criados pelo partido. Mas esse debate passa longe das brigas por espaço das velhas lideranças.
Alckmin exigiu voltar ao governo de São Paulo e se colocou contra a renovação do PSDB. Ao deixar o partido e tentar transferir ao petismo o histórico de realizações do PSDB, joga uma pá de cal na sua credibilidade e se anula politicamente. É como se tentasse legar ao PT quase 30 anos de governo tucano em São Paulo. Dificilmente o eleitorado vai entender essa metamorfose. Principalmente a população mais conservadora do interior do Estado, que apoiava o ex-governador contra as bravatas petistas. É bom lembrar que Alckmin tem um histórico sofrível em disputadas nacionais, como o fiasco na eleição presidencial de 2006, quando perdeu para o próprio Lula e teve menos votos no segundo turno do que no primeiro.
Se sacramentar a chapa com o ex-inimigo, o ex-governador ficará sozinho na batalha de 2022, e no máximo servirá de escada para o renascimento do lulismo e a sobrevida do bolsonarismo, sacrificando o PSDB. É provável que Lula o descarte até o momento da eleição, pois tudo o que o petista não deseja é um vice que ameace sua posição. E Alckmin pode estar acenando com esse casamento exatamente porque já sente que suas chances de voltar ao Palácio dos Bandeirantes, brigando contra o ex-partido, são pequenas. Ao invés de fazer um jogo político esperto e surpreendente para renascer no cenário nacional, o ex-governador estará apenas praticando um suicídio político, rifando a própria biografia e dando mais combustível ao populismo – aquilo que o PSDB dizia combater.
Disparada, a inflação bateu mais um recorde sinistro no mês passado, quando os preços pagos pelas famílias subiram 1,25%, a maior taxa para um mês de outubro desde a alta de 1,31% em 2002
Da coluna Notas&Informações de o Estadão
A vacinação tem atenuado o risco da pandemia, mas nenhum imunizante protege a população contra o encarecimento dos bens e serviços essenciais à vida. Batalhando com muita dificuldade para comprar o necessário à sobrevivência, o brasileiro já enfrentou um aumento de preços de 8,24% nos dez meses a partir de janeiro. A variação acumulada em 12 meses, de 10,67%, igualou a do ano-calendário de 2015, um dos marcos inesquecíveis do governo da presidente Dilma Rousseff. O presidente Jair Bolsonaro ainda terá mais de um ano para superar a desordem econômica e o desarranjo fiscal criados por sua antecessora petista. Ele tem se esforçado para isso e é justo reconhecer seu empenho.
Ninguém pode negar, também, a amplitude do desastre. Em outubro os aumentos de preços ocorreram nos nove grandes grupos de itens cobertos pela pesquisa, assim como em todos os Estados e no Distrito Federal. A capital do País entra nessa história de duas formas, como área atingida pela inflação e como local de origem de pressões inflacionárias. No cenário brasiliense ocorreram, por exemplo, as omissões e ações no tratamento incompetente da crise hídrica, prevista há muito tempo, e de seus efeitos na produção de eletricidade e em outras formas de uso.
A capital federal tem sido também o palco principal das ações bolsonarianas, concentradas em interesses particulares, distantes das obrigações governamentais e perigosas para as contas públicas. Insegurança e instabilidade cambial têm sido efeitos notórios desse comportamento, com reflexos inegáveis na inflação e nas expectativas, mais pessimistas a cada semana, de crescimento econômico neste e nos próximos anos.
Quando a inflação se acelera e se espalha, como tem ocorrido no Brasil, é um tanto fantasioso buscar os vilões, como se dizia antigamente, em cada divulgação de um novo balanço mensal. Há uma clara metástase inflacionária e esse é o dado mais importante para quem deve, como os dirigentes do Banco Central, cuidar da terapia. Mas vale a pena, com realismo, apontar os aspectos mais dolorosos desse desarranjo, como a alta dos preços da alimentação, o encarecimento do transporte público e o aumento dos preços da eletricidade e do gás de cozinha, com taxas acumuladas em 12 meses de 11,71%, 9,80%, 30,27% e 35,90%, respectivamente, segundo os últimos dados do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).
Cotações internacionais e desajustes nas cadeias de abastecimento, observados globalmente, explicam apenas em parte o surto inflacionário no Brasil. O desarranjo cambial, a incompetência do poder central e a insegurança dos empresários são fatores importantes para entender por que a inflação brasileira tem sido uma das três maiores dos países-membros do Grupo dos 20 (G-20). Também isso diferencia o desempenho do presidente Bolsonaro.
O presidente da Nicarágua, Daniel Ortega, obteve seu quarto mandato consecutivo com 75% dos votos em uma eleição com participação de 65%. A narrativa oficialista contrasta com os mais de cem detidos em condições degradantes após os protestos de 2018.
Da coluna Notas&Informações
Segundo a organização Urnas Abiertas, a abstenção teria superado 80%. O instituto Gallup apontou que 65% dos nicaraguenses votariam em qualquer candidato fora da órbita de Ortega. Mas não tiveram essa opção. Ortega enfrentou adversários biônicos de partidos satélites. Antes, eliminou os três partidos de oposição, encarcerou sete candidatos e obliterou a observação externa.
Após liderar a revolução sandinista contra o ditador Anastasio Somoza em 1979, Ortega manteve-se no poder até 1990, e retornou em 2007. Mais do que radicalizar suas origens socialistas, ele seguiu o precedente nepotista da dinastia Somoza, instalando sua mulher na vice-presidência. Ele extinguiu a imprensa independente e controla o Parlamento e as cortes. A economia, uma das mais pobres das Américas, encolheu desde 2018, após perder apoio financeiro da Venezuela. Os protestos explodiram e mais de 400 pessoas foram mortas.
Países como El Salvador, Honduras e Guatemala seguem esse caminho, cooptando o Judiciário, instalando procuradores fantoches, expurgando a oposição, eliminando a imprensa livre e expulsando organizações de direitos humanos.
Hoje, suas populações têm pouco a esperar dos vizinhos latino-americanos. O presidente do México, principal influência na região, mantém silêncio sobre essas manobras autoritárias e desrespeita o Estado de Direito em casa. No Brasil, as melhores forças democráticas estão consumidas na resistência ao autoritarismo de seu presidente. Na oposição, o PT, cujo líder, Lula da Silva, lidera as intenções de voto à Presidência, celebrou a “grande manifestação popular e democrática” na Nicarágua, em referência à farsa eleitoral. O PT, que costuma festejar a “democracia” de Cuba e Venezuela, diz que seguirá com os sandinistas num “caminho de construção” que sirva “de exemplo para o mundo”.
A diplomacia da União Europeia descreveu a Nicarágua como “uma das piores ditaduras do mundo”. O presidente dos EUA, Joe Biden, disse que as eleições foram uma “pantomima”, e usará ferramentas diplomáticas e econômicas para apoiar os nicaraguenses. Mas a Europa está distante e Biden está vulnerável em meio a conflitos intestinos nos EUA.
Essas fragilidades são um motivo a mais, não a menos, para a comunidade internacional mobilizar pressões multilaterais contra a escalada autoritária centro-americana. No caso da Nicarágua, os EUA aplicaram sanções a diversas lideranças. A Organização dos Estados Americanos não deveria hesitar em suspender a participação do país. Internamente, a aliança sandinista com o empresariado está em deterioração, e os protestos de 2018 mostram que o povo está pronto a dar um basta se lhe forem dadas condições. A história dos Somozas afiança que a ditadura de Ortega pode não durar muito mais tempo. Mas é preciso fazer o possível para encurtá-la.