Encontros concretizam um movimento do ex-presidente em direção a lideranças contra as quais disputou eleições nos últimos anos
Por Daniel Weterman
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se reuniu na manhã desta segunda-feira, 23, com os senadores Tasso Jereissati (PSDB-CE) e Cid Gomes (PDT-CE) em Fortaleza, em agendas distintas, além do ex-presidente do Senado Eunício Oliveira (MDB-CE). Os encontros concretizam um movimento de Lula em direção a lideranças contra as quais disputou eleições nos últimos anos mirando na sucessão presidencial de 2022, em oposição ao presidente Jair Bolsonaro
Lula viajou ao Ceará e havia pedido, há uma semana, reunião com Tasso. O encontro durou aproximadamente uma hora e ocorreu no escritório particular do tucano. A presidente nacional do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PT), e o ex-deputado estadual Ilário Marques (PT-CE), acompanharam Lula na agenda.
Após a conversa, o senador afirmou, por meio da assessoria de imprensa, que a conversa girou em torno do cenário atual da política brasileira, da importância da defesa intransigente da democracia, do fortalecimento das instituições e do compromisso de resistência a qualquer ato ou medida que ponha em risco a democracia no País. De acordo com o tucano, nenhuma aliança eleitoral entrou na pauta.
O encontro entre Lula e Tasso ocorreu após uma reunião do petista com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, em maio. FHC já admitiu votar em Lula em um segundo turno contra Bolsonaro. Tasso é apontado como um dos pré-candidatos às prévias do PSDB para definição do candidato ao Planalto em 2022, disputa na qual Bolsonaro e Lula protagonizam uma polarização. O senador deve anunciar até setembro se realmente vai concorrer às primárias do partido, marcadas para novembro.
Apesar de estarem em campos opostos, Tasso e Lula mantiveram um nível de diálogo nos últimos anos. Durante a prisão do petista em Curitiba (PR), o senador enviou carta ao ex-presidente em solidariedade após a morte do neto de Lula, em março de 2019. No Ceará, PT e PSDB devem continuar em campos distintos. Os tucanos caminham para uma aliança com o PDT, enquanto a legenda petista fala em candidatura própria.
Após a conversa com o senador do PSDB, Lula se encontrou com o senador Cid Gomes (PDT), irmão do ex-candidato do PDT à Presidência Ciro Gomes, que vem intensificando ataques ao petista, e com o governador Camilo Santana (PT). Além disso, teve uma agenda com o ex-presidente do Senado Eunício Oliveira (MDB).
O ex-presidente Lula tem feito aceno aos partidos de centro e dado sinais que pretende formar uma aliança para além da esquerda em oposição a Bolsonaro no próximo. Um dos partidos mais próximos, de acordo com aliados do ex-presidente, é o PL, legenda "número 2" no bloco formado pelo Centrão e que hoje declara apoio a Bolsonaro.
Por Gustavo Côrtes
O presidente Jair Bolsonaro afirmou nesta segunda-feira, 23, em seu retorno ao Palácio da Alvorada, que "conspira para que todos cumpram a Constituição", sem especificar o assunto ao qual se referia. Na última sexta-feira, 20, entregou ao Senado pedido de impeachment do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, que conduz o inquérito das fake news no qual o chefe do Executivo foi incluído por declarações feitas em uma de suas transmissões semanais pela internet contra o sistema de voto eletrônico. "Só tenho uma coisa a falar: estou conspirando, sim, e muito, para que todos cumpram a nossa Constituição, ok? Essa é a minha conspiração. Cumpram a Constituição, só isso", disse.
O presidente também prometeu enviar à Casa pedido de impeachment do também ministro do STF e presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Luís Roberto Barroso, contra quem tem feito ataques sistemáticos em suas investidas retóricas na defesa da implementação do voto impresso, rejeitado pelo Congresso no último dia 10.
Bolsonaro justificou seu retorno à residência oficial ainda de dia: "tenho duas agendas aqui (no Palácio da Alvorada), não estou chegando 17h30 em casa, não", afirmou. A Agenda Oficial, no entanto, não indicava nenhuma atividade oficial depois das 17h.
Em meio à crise entre Executivo e Judiciário, ex-presidente ressaltou que é necessário 'esforço' para manter regras democráticas
Por Thaís Barcellos
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) minimizou neste domingo, 22, o risco à ordem e à Constituição no País. Ele destacou, no entanto, que é necessário um esforço daqueles que têm compromisso com a vigência das leis para que a regra democrática seja reforçada e mantida.
"Qual é a possibilidade de quebrar a regra no Brasil? Acho que é baixa", disse Fernando Henrique. Ele participava de um evento do grupo Parlatório com o tema O Futuro de uma Nação e curadoria do ex-presidente Michel Temer, transmitido pela internet.
Neste domingo, reportagem do Estadão mostrou que ex-presidentes da República têm procurado comandantes militares para avaliar o risco de ruptura institucional no País. A reportagem mostrou que os militares têm afirmado que haverá eleições e que o vencedor será empossado, seja ele quem for. A articulação está sendo feita por todos os ex-presidentes, com exceção de Dilma Rousseff (PT).
No evento online, FHC disse não observar neste momento nenhum integrante das Forças Armadas dizendo que vai descumprir as regras e a Constituição.
"Conheço pouco das Forças Armadas, mas não vejo nas Forças Armadas risco à ordem", ele disse. "Neste momento nos cabe apoiar as normas, senão as pessoas se sentem à vontade para agir conforme seus impulsos. Temos que exercer nossa influência para cumprimento da ordem. Para isso tenho coragem", completou.
O ex-presidente também disse que "o fato de ter presidente que é baixo oficial (referência a Jair Bolsonaro) não quer dizer que vai ser autoritário, mas pode ter ímpetos." Na abertura do debate, Temer disse que "toda vez que há desarmonia entre os Três Poderes há inconstitucionalidade".
A transmissão do grupo Parlatório também contou com a participação do ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Carlos Ayres Britto, do ex-ministro da Fazenda Joaquim Levy, do embaixador Rubens Barbosa, do presidente da Vibra Energia (nova marca corporativa da BR Distribuidora), Wilson Ferreira Júnior, e do general Otávio Rêgo Barros, que foi porta-voz do governo Bolsonaro.
STF tem papel 'construtivo', diz FHC
Para Fernando Henrique, o STF tem tido "papel construtivo", "normal" e "legítimo" de colocar limites nos Poderes Legislativo e Executivo.
"Quando o presidente ou quando o Congresso extrapola, o STF tem que ter coragem. Eu tenho respeito pelo STF, não acho que estejam extrapolando", afirmou.
Na última sexta-feira, 20, Bolsonaro entrou com pedido de impeachment no Senado do ministro do STF Alexandre de Moraes. Mas também tem dito que o ministro da corte Luís Roberto Barroso tem extrapolado os limites da Constituição.
Por Ricardo Noblat
É forte o assédio ao general Hamilton Mourão, vice-presidente da República, para que ele se comprometa em não tentar a reeleição caso Jair Bolsonaro seja impedido de completar seu mandato.
Há poucos políticos entre os que assediam Mourão. Há militares, da reserva e da ativa, empresários do eixo Rio-São Paulo-Minas Gerais ou seus representantes. O general não abre a guarda.
Itamar Franco, vice de Fernando Collor, não precisou assumir tal compromisso. Não havia reeleição à época. Temer assumiu, embora tenha cogitado mais tarde em se reeleger.
Mourão é alvo de vigilância dos órgãos de espionagem do governo. Está sendo monitorado o tempo todo e sua equipe de segurança coleciona indícios disso. É muito cuidadoso quando fala ao celular.
No dia em que blindados da Marinha desfilaram na Praça dos Três Poderes a pretexto de entregar um convite a Bolsonaro, ele reuniu-se com o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal.
A reunião foi na casa de Barroso, no bairro do Lago Sul. Bolsonaro ficou sabendo dela antes mesmo do general despedir-se do ministro. Descontrolou-se e disse todos os desaforos que conhece.
O estado de desidratação de Bolsonaro preocupa Lula e os que apoiam sua candidatura. Um Bolsonaro pela tabela poderá dar lugar no segundo turno a outro nome.
Lula carece de Bolsonaro para se eleger e a recíproca é a mesma. Lula joga praticamente parado porque sua vaga no segundo turno parece assegurada. Bolsonaro cria confusão porque a dele não está.
Grupo de partidos marcados por ideologias distintas tem sido o fiador do governo no Congresso, mas o relacionamento corre o risco de ser abreviado por conta do desempenho eleitoral de Bolsonaro no ano que vem
Por Ingrid Soares / Israel Medeiros
Com frequentes crises, investigações de corrupção e polêmicas, o governo do presidente Jair Bolsonaro se sustenta graças ao Centrão. Em troca de cargos e prestígio político para se perpetuar no poder, esse grupo, formado por diversos partidos com identidades distintas, tem sido a base governista. À medida que a situação de Bolsonaro se complica, no entanto, o relacionamento que resultou em Ciro Nogueira (PP-PI) – que já foi aliado do PT – na Casa Civil, parece ter os dias contados.
A pesquisa XP/Ipespe, divulgada na semana passada, mostrou que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ampliou a vantagem na disputa pelo Planalto em 2022. O petista aparece com 40%, 2 pontos percentuais a mais que no levantamento anterior, enquanto Bolsonaro tem 24%, 2 pontos a menos que na última sondagem. Já a rejeição ao nome do presidente no pleito chegou a 61%, contra 45% de Lula. Somado a isso, o chefe do Executivo não tem conseguido dar prosseguimento a projetos prioritários do governo como as reformas tributária e administrativa em meio a uma escalada contra o Judiciário.
Aliados do governo já enxergam a gestão de Bolsonaro como uma “canoa furada” e ensaiam um desembarque, rumo à candidatura de Lula. Faltando aproximadamente um ano e dois meses para o pleito de 2022, a situação desses partidos começa a se definir e os políticos terão de decidir qual caminho será mais benéfico para eles eleitoralmente. No caso de Ciro Nogueira, por exemplo, há a intenção de se candidatar ao governo do Piauí, estado nordestino com grande potencial de voto petista. Vale lembrar que o atual governador, Wellington Dias, é do PT. Não seria uma surpresa, portanto, se Nogueira ignorasse o fato de ser “a alma do governo” — como foi apelidado por Bolsonaro — e corresse para os braços de Lula.
O cientista político Cristiano Noronha, da consultoria Arko Advice, ressalta que, apesar do derretimento da popularidade do mandatário, há um timing para o Centrão decidir se mudará de lado ou se seguirá apoiando o governo, o que deve coincidir com o período eleitoral, no começo de abril do próximo ano.
No entanto, destaca, ainda não é de interesse do bloco deixar o governo. “Falta muito tempo até a eleição do próximo ano. Em um segundo ponto, no Brasil vigorou o aspecto da verticalização que condicionava as alianças no plano estadual e federal. Não há obrigação de obedecer à risca a coligação federal e isso cria a possibilidade de que tenham outro candidato em âmbito local se for conveniente para eles”, explica.
Mesmo que o Centrão apoie outro candidato em 2022, acredita, não significa que Bolsonaro ficará totalmente descoberto. “O centrão não tem problema em apoiar um candidato à presidência e, eventualmente ganhando outro, ele se associar. Existem tipos de abandono. Podem apoiar outro candidato, mas abandono não significa apoiar um impeachment, por exemplo”.
“Se o Centrão sair do governo não necessariamente significa grande derrota pois se Bolsonaro for reeleito, eles poderiam voltar ao poder. Vão esperar o máximo que puderem. É uma decisão que será tomada só no ano que vem. Além disso, não são um bloco que age unido. Pode ser que conte com o apoio de alguns partidos do Centrão em alguns estados. Creio que vão analisar e levar em consideração a característica local. Mas claro, no âmbito federal o presidente não terá todos os partidos do centro compondo na chapa dele”, acrescenta.
Cenário de negociação intensa
O analista político do portal Inteligência Política, Melillo Dinis, destaca que a inconstância do chefe do Executivo é um cenário positivo para o Centrão, que aumenta seu preço, amplia os recursos e as manobras de captura do orçamento público e impõe maiores ganhos dos espaços de poder. “Bolsonaro vive da colisão entre os Poderes e a submissão ao grupo. Neste zigue-zague permanente de tensões, Bolsonaro tem um projeto de reeleição e uma permanente tentação autoritária. O presidente não tem um partido para chamar de seu. Está sozinho no espectro partidário e ainda não conseguiu um que se doe inteiramente ao modelo que deseja. A estratégia da maioria dos atuais partidos é sobreviver aos limites da legislação que exigem investimentos em bancadas e não em candidatos para o executivo. Nessa linha, cada vez mais será necessário viver a solidão e a sofrência”, expõe.
Ricardo Caichiolo, cientista político do Ibmec-DF, afirma que se trata de um cenário de negociações intensas entre os partidos, mesmo a mais de um ano das eleições, envolvendo movimentações tanto por parte de Lula, de Bolsonaro, e da chamada “terceira via”.
“Fica claro que os partidos do Centrão, mais uma vez, serão pragmáticos e apoiarão o candidato que apresentar a melhor probabilidade de se sair vencedor no ano que vem. Tanto que o Republicanos e o Progressistas procuraram o petista para costurar acordos regionais, impulsionados pelas recentes pesquisas que o apontam na liderança da corrida presidencial”, avalia.
O presidente está em uma situação delicada diante do cenário pandêmico, de inflação e crise hídrica, analisa. “A grande aposta para a reversão desse cenário eleitoral desfavorável a ele é que a economia cresça em um ritmo mais acelerado no último trimestre de 2021 e ao longo de 2022, o que parece improvável”.
Diferentemente, o quadro que se pinta para 2022 é de um crescimento do PIB em torno de apenas 2%, combinado com um aumento da inflação e com uma taxa altíssima de desempregados. Por fim, referindo-se à chamada “terceira via”, o cenário atual é de dúvida quanto à possibilidade de que os atores envolvidos cheguem ao consenso quanto ao lançamento de um único nome”, continua. (IS e IM)
"Fica claro que os partidos do Centrão, mais uma vez, serão pragmáticos e apoiarão o candidato que apresentar a melhor probabilidade de se sair vencedor no ano que vem”
Melillo Dinis, analista político
Tendência de dispersão na campanha
O deputado Fábio Trad (PSD-MS) explica que o Centrão é uma força que só existe durante o mandato e que, por ser formado por vários partidos com identidades próprias, é natural que, em época de campanha eleitoral, o grupo fique disperso. “Na campanha, ele se dispersa com lideranças apoiando um ou outro. Não são uma força política de campanha, mas de mandato. Sobretudo no Nordeste, é possível que migrem aos poucos para a candidatura do Lula. Mas não haverá uma percepção orgânica súdita, como se fosse uma decisão unificada.”
Ele acredita que se Bolsonaro continuar na guerra declarada ao Supremo, há uma grande possibilidade de o Centrão desembarcar do governo. Fidelidade não é uma característica desse grupo. “Ele (o Centrão) não admite esse tipo de investida. Nós estamos observando que o Centrão foi que votou contra o voto impresso, por exemplo. A criminalização de decisões de ministros é reprimida pelo centrão. Se o Bolsonaro apostar nesse tensionamento, a tendência é desgastar mais ainda”, aponta.
Trad explica que seu partido, o PSD, tem tomado um posicionamento mais independente. “O presidente Kassab critica algumas posturas do presidente, mas a maioria da bancada tem a tendência de acompanhar o governo na maioria dos projetos. Ultimamente eu não tenho visto isso. Não é mais aquela adesão automática e incondicional, está aos poucos se aproximando de uma postura de análise prévia do que está sendo analisado e o partido tem se tornado mais independente”.
A legenda possui, por exemplo, o senador Omar Aziz (AM), no comando da CPI da covid. Ao mesmo tempo, o deputado governista Reinhold Stephanes Junior (PR), que tumultuou uma sessão da CPI no início de agosto, também é do mesmo partido. Há, portanto, diversidade de pensamentos.
Já o deputado de oposição Afonso Florence (PT-BA) lembra que o modelo de presidencialismo de coalizão, que vigora no país, obriga o chefe do Executivo a fazer acordos com partidos se quiser garantir a governabilidade. Florence aponta, no entanto, que independente dos acordos feitos por Bolsonaro com o centrão, o que não faltam são provas de que o chefe do Executivo cometeu crimes no exercício do mandato.
“Ele tem resiliência, mas a perda de popularidade tem sido tão rápida que de fato ele é um político que joga os aliados, os partidos de centro na incerteza. No plenário, é comum ver alguém que era nosso aliado, passou a votar com o governo e agora diz que Lula vai ganhar as eleições e quer voltar para o nosso lado”, revela.
O deputado, que já foi ministro do governo Dilma, pontua que, no caso dos partidos do Centrão, há convergências econômicas com o governo, o que faz com que a iminência de um governo progressista soe como ameaça a esses partidos. Daí, segundo ele, nascem iniciativas como a mudança do sistema de governo, o fim do financiamento público de campanhas (com o objetivo de limitar as candidaturas) e assim por diante.
Para o petista, a chegada de Ciro Nogueira à Casa Civil foi estratégica para o presidente do PP, que visa ser candidato a governador no Piauí no ano que vem. Por isso, para ele, vale a pena ser ministro do governo Bolsonaro, enquanto isso lhe render mídia espontânea. Por outro lado, a influência de Nogueira em temas legislativos também é benéfica. “Assumir um ministério é algo positivo para ele, um senador virar ministro. Por outro lado, eles (Centrão) também querem legislar. Estou coordenando a reforma tributária na oposição e eles estão pilotando-a”, opina o parlamentar. (IS e IM)