Parlamentares da oposição se preparam para tentar barrar indicação de Lula ao Supremo
Por Guilherme Resck
A sabatina do atual ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado deverá contar com indagações de senadores oposicionistas sobre os diferentes momentos da carreira do indicado por Lula (PT) ao Supremo Tribunal Federal, que tem um período como juiz e outro como político, e se ele agiu corretamente durante o ataque às sedes dos Três Poderes em 8 de janeiro.
O SBT News apurou que o líder da bancada do Partido Liberal (PL) no Senado, Carlos Portinho (RJ), membro titular da CCJ, focará em demonstrar na sabatina, recuperando a carreira de Dino, que ele não possui notório saber jurídico - um dos requisitos constitucionais para ser ministro do Supremo. Os senadores do Partido Liberal são contra a indicação. Quatro dos membros titulares da CCJ são da sigla: além de Portinho, Flávio Bolsonaro (RJ), Magno Malta (ES) e Marcos Rogério (RO).
"Espera-se de um ministro da Suprema Corte uma postura de equilíbrio, serenidade e capacidade para dialogar e se manter distante de paixões políticas e ideológicas. Não é o caso de Flávio Dino. Nunca antes na história do Brasil vimos um ministro com tamanho apego ideológico", argumentou Marcos Rogério no X, nesta 3ª feira (28.nov). Ainda na rede social, na 2ª feira (27.nov), quando Dino foi indicado, Magno Malta afirmou que trabalhará "ativamente para conseguir mais votos contrários" à aprovação.
Na mesma data, Flávio Bolsonaro fez uma publicação chamando de "descaramento e um absurdo" indicar Dino ao Supremo. "A Suprema Corte precisa de gente qualificada e técnica, não de um político profissional que vai usar todos os seus poderes para proteger os esquemas do PT e os amigos, além de fazer avançar as pautas da esquerda como aborto e legalização de drogas", acrescentou.
Flávio ainda acusou Lula e Dino de serem ameaçadas à democracia do Brasil disse que "o STF não pode ser um órgão político, a Corte dos amigos". "Isso é inadmissível numa democracia. Lula indicar um AMIGO extremamente íntimo é um atrevimento gigantesco com o Congresso Nacional e com o Brasil. Cobre o seu parlamentar para que este absurdo não passe no Senado!".
Apesar de o PL já ter anunciado que seus senadores votarão contra a indicação e outros senadores oposicionistas já terem afirmado que votarão contra também, como Damares Alves (Republicanos-DF) e Eduardo Girão (Novo-CE), o posicionamento, ao menos por enquanto, não é unanimidade na oposição.
Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) disse à reportagem que ainda está analisando a indicação. "Não tenho um juízo ainda sobre esse assunto".
Ele também é titular da CCJ. Questionado se acredita que Dino será indagado na sabatina sobre sua atuação no 8 de janeiro, pontuou: "Alguns vão perguntar sobre isso".
Zequinha Marinho (Podemos-PA), suplente da CCJ, disse considerar fundamental que a oposição questione, na sabatina, se Dino vai deixar "a questão política e ideológica e se concentrar só na questão legal" caso se torne ministro do Supremo.
O SBT News perguntou a ele ainda como avalia a indicação, se positiva ou negativa. Em resposta, pontuou: "O governo trabalha com o melhor que ele tem. Uma vaga dessa aí é uma vaga única. O governo tem que botar alguém da sua inteira confiança. E acho que ele fez da forma que ele achou correta. Direito de todo mundo democraticamente a aceitar ou não aceitar, querer ou não querer. Acho que o governo fez a parte dele".
Hamilton Mourão (Republicanos-RS), que já anunciou que votará contra a indicação, disse que "provavelmente" o tema da atuação de Dino no 8 de janeiro será abordado durante a sabatina. Ao menos parte da oposição no Congresso defende que o Governo Federal agiu com omissão no episódio. Na CPMI dos Atos de 8.jan, oposicionistas, incluindo suplentes da CCJ, chegaram a apresentar votos em separado defendendo essa tese e pedindo o indiciamento de Flávio Dino.
Tema em almoço
A sabatina de Dino, que está marcada para 13 de dezembro, foi um dos temas discutidos por senadores oposicionistas, incluindo Portinho, em almoço realizado nesta 3ª feira, em Brasília. Os parlamentares fazem o almoço toda 3ª, para discutirem pautas.
Placar
Dino precisa de no mínimo 14 votos favoráveis na CCJ para que sua indicação seja aprovada pelo colegiado. A votação é secreta. Nesta 3ª, o senador Weverton (PDT-MA), relator da indicação do ministro, apostou que serão de 17 a 20 votos favoráveis. No plenário, depois, ele precisa de pelo menos 41, e Weverton estima que serão mais de 50. Recentemente, porém, o plenário rejeitou uma indicação de Lula para a Defensoria Pública da União (DPU).
Idas ao Congresso
Dino está acostumado a responder questionamentos de parlamentares cara a cara: ele participou de diversas reuniões em comissões do Senado e Câmara neste ano, devido à aprovação de requerimentos de convite e convocação.
Respostas dele durante essas participações chegaram a viralizar na internet. Por exemplo, quando disse para o senador Marcos do Val (Podemos-ES) que se o parlamentar era da Swat, ele (Dino) era dos Vingadores.
Caso trata de uma entrevista dada em 1995 em que ex-deputado federal foi identificado como participante de atentado a bomba
Por Ana Isabel Mansur - R7
O Supremo Tribunal Federal (STF) julga na próxima quarta-feira (29) um recurso extraordinário que, na prática, pode levar ao cerceamento da liberdade de imprensa e à autocensura de veículos de comunicação, como afirmam especialistas em direito constitucional ouvidos pelo R7. A determinação dos ministros tem repercussão geral, ou seja, será regra em outros casos parecidos.
A ação trata de publicação em matéria jornalística de atos inverídicos. Em agosto, a Corte decidiu que veículos de imprensa podem ser responsabilizados civilmente por declarações de terceiros publicadas. Agora, os ministros precisam deliberar a tese da ação. Durante a votação, em agosto, não houve consenso sobre as circunstâncias que podem causar punição.
O recurso extraordinário é relativo a um episódio de 1995. À época, o jornal Diário de Pernambuco publicou uma reportagem na qual o entrevistado acusava o então deputado federal Ricardo Zarattini, morto em 2017, de participar de um atentado a bomba no aeroporto do Recife, em julho de 1966. O episódio matou duas pessoas e feriu outras 14. Zarattini foi inocentado das acusações que envolveram o caso, na década de 1980. A ação em análise pelo STF foi aberta pelo ex-parlamentar contra o noticiário.
Na primeira instância, o Diário de Pernambuco foi condenado a indenizar o ex-deputado em R$ 700 mil por danos morais. O periódico entrou com recurso, e a segunda instância reverteu a decisão para considerar o pedido de Zarattini improcedente. Em análise no Superior Tribunal de Justiça (STJ), a decisão foi favorável ao ex-parlamentar, mas reduziu o pagamento para R$ 50 mil.
O caso chegou ao STF em setembro de 2017, com relatoria do ministro Marco Aurélio Mello, que se aposentou da Corte, em 2021. Ele decidiu, antes de sair do Supremo, que "empresa jornalística não responde civilmente quando, sem emitir opinião, veicule entrevista na qual é atribuído, pelo entrevistado, ato ilícito a determinada pessoa".
O R7 entrou em contato com o deputado federal Carlos Zarattini (PT-SP), filho do ex-parlamentar Ricardo Zarattini, mas não ainda recebeu retorno.
Segundo o advogado especialista em direito constitucional Acácio Miranda, há duas possibilidades em jogo — a responsabilização conjunta do jornal e do entrevistado e um caminho intermediário. Para ele, o primeiro caso pode causar "prejuízos à liberdade de imprensa e manifestação".
"Significa que o órgão de imprensa será corresponsável pelas informações transmitidas. É uma posição preocupante, porque revela, mesmo que indiretamente, um viés de censura. Impõe certo temor aos veículos de imprensa, e, obviamente, pelo menos os mais sérios, dificilmente vão compartilhar informações sob esse risco. A segunda alternativa mantém a responsabilização, mas não prevê uma indiscriminada", avalia o especialista.
Na segunda hipótese, a responsabilização seria apenas do entrevistado, com inclusão da empresa jornalística "quando ela tivesse ciência que as informações transmitidas eram inverídicas ou erradas ou quando a empresa não consultou a fonte". "É o melhor caminho, só vai responsabilizar o veículo de informação quando há omissão ou equívoco deliberado do jornalista e o veículo acompanha", completa.
Se você responsabilizar o veículo de informação de forma objetiva, sem que soubesse [da informação falsa], você está indiretamente criando uma forma de censura. Se você responsabilizar indistintamente o veículo de informação, obviamente ele terá receio. E, das duas, uma: ou disponibiliza a informação e paga para ver ou, o que é mais condizente com as nossas circunstâncias, não vai publicar.
ACÁCIO MIRANDA, ADVOGADO ESPECIALISTA EM DIREITO CONSTITUCIONAL
A coordenadora de Incidência da Repórteres sem Fronteiras (RSF) para a América Latina, Bia Barbosa, avalia que, a depender da tese geral, pode haver impactos irreversíveis para o cotidiano das redações e para o direito de acesso à informação pela população. "As entrevistas são fundamentais para o ofício da atividade jornalística. Basta a gente lembrar de episódios históricos — o do Pedro Collor [irmão caçula do ex-presidente Fernando Collor, autor das acusações contra o tesoureiro PC Farias, que levaram à abertura do processo de impeachment do ex-presidente] e a do Roberto Jefferson [ex-deputado que delatou o esquema do Mensalão], que tiveram um impacto muito grande nos rumos do país e revelaram fatos fundamentais", defende.
Para a coordenadora, as falas de terceiros publicadas em jornais podem ser o ponto central da reportagem. "É claro que entrevistados podem dar declarações polêmicas e até questionáveis, mas, nesses casos, muitas vezes as próprias declarações viram notícia, principalmente se forem feitas ou envolverem figuras públicas. Responsabilizar indiscriminadamente os meios de comunicação pelo que dizem os seus entrevistados pode gerar muitas consequências do ponto de vista de autocensura", observa.
Bia concorda com o colega advogado em relação ao risco de autocensura. "No jornalismo atual, a gente já vive um quadro de assédio judicial crescente, praticado, principalmente, por autoridades para silenciar o exercício jornalístico. Se a tese do STF for no sentido de responsabilizar permanentemente os meios de comunicação por qualquer fala de entrevistados, o risco de os processos se multiplicarem vai gerar, necessariamente, essa autocensura", avalia.
"Pressupor que, para fazer uma entrevista, inclusive ao vivo, os jornalistas tenham que controlar previamente toda e qualquer declaração a ser feita pelos entrevistados gera risco de autocensura", analisa.
A especialista defende a ideia de que o entendimento do STF considere alguns pontos. "Se é ao vivo ou numa entrevista publicada depois, o que permite análise posterior do que o entrevistado disse; considerar a quais informações o jornalista poderia, razoavelmente, ter acesso no momento da apuração e da publicação; e, principalmente, qual foi a posição que o meio de comunicação teve diante das declarações — se, por exemplo, deu espaço ao contraditório, se eventualmente corrigiu ou contextualizou uma informação dada pelo entrevistado", lista.
O advogado e cientista político Nauê Bernardo acredita que o STF não arriscará a autocensura dos meios de comunicação. "O Supremo tem uma linha bem sólida de defesa da liberdade de imprensa. Então é difícil acreditar que esse entendimento vai permitir um cerceamento da liberdade de imprensa. O Supremo Tribunal Federal sempre teve muito cuidado com esses aspectos, e, inclusive, isso ficou expresso em julgamentos mais recentes, como aquele do direito ao esquecimento. Sou cético quanto à possibilidade de o Supremo cercear a liberdade de imprensa", avalia.
Os ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) apostam no presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), para barrar o avanço da PEC (proposta de emenda à Constituição) que limita as decisões individuais na corte.
POR MATHEUS TEIXEIRA
A matéria foi aprovada no Senado na quarta-feira (22) e determina que apenas o plenário do tribunal pode derrubar atos do presidente da República e dos chefes do Legislativo.
A avaliação de integrantes do STF nos bastidores é que o deputado irá segurar a matéria para manter uma boa relação com o Supremo devido às decisões do ministro Gilmar Mendes de barrar investigações contra ele.
Gilmar anulou provas relacionadas a Lira em investigação sobre supostos desvios de recursos públicos em contratos de kit robótica que envolvem aliados do deputado. Antes, o ministro já havia determinado a suspensão da investigação.
Ministros também dizem acreditar que a ação do presidente do tribunal, Luís Roberto Barroso, de retirar de pauta julgamentos polêmicos, como a descriminalização das drogas e do aborto, foi uma sinalização importante ao Legislativo e ajuda a reduzir a pressão na Câmara pela votação da PEC.
Deputados e senadores se queixam de ações do Supremo que, dizem, interfere em prerrogativas do Legislativo. Além dos casos das drogas e do aborto, eles também citam o julgamento do STF que determinou inconstitucional a tese do marco temporal das terras indígenas.
Mesmo se a avaliação estiver errada e os deputados aprovarem o texto, ministros do STF afirmam nos bastidores que o tribunal tem maioria para invalidar a PEC das decisões individuais.
Os magistrados dizem em conversas reservadas que a PEC viola a Constituição por limitar o acesso dos cidadãos à Justiça, uma vez que muitos pleitos judiciais são atendidos via decisões individuais.
O decano da corte, ministro Gilmar Mendes, já deu indícios, em discurso no início da sessão desta quinta (23), que o Supremo não hesitaria em derrubar a PEC.
"O fato é que este Supremo Tribunal Federal, sempre atento às suas responsabilidades institucionais e ao contexto que o cerca, está preparado para enfrentar, uma vez mais e caso necessário, as investidas desmedidas e inconstitucionais provenientes, agora, do Poder Legislativo", afirmou.
O magistrado fez duras críticas à PEC e usou a expressão "pigmeus morais" para se referir a seus apoiadores.
Barroso também fez uma fala em defesa do Supremo e afirmou que o Brasil vive diversos problemas, como crime organizado e mudança climática, e que mudanças na corte não devem ser a prioridade do país.
"O STF não vê razão para mudanças constitucionais que visem alterar as regras de seu funcionamento", afirmou.
Barroso disse que o Supremo enfrentou negacionismo na pandemia da Covid-19 e o negacionismo climático devido às queimadas na Amazônia, além de ter sido um "dique de resistência contra avanço autoritário".
A ala ligada ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) no Senado sempre defendeu a aprovação da proposta. O texto, porém, só avançou após ganhar o apoio do presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
Foram 52 senadores a favor, 18 contra e nenhuma abstenção, tanto na votação do primeiro como do segundo turno. Até o líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), foi favorável, o que ampliou a crise e inseriu o Executivo na disputa entre os Poderes.
O apoio de Pacheco foi visto por parlamentares como uma movimentação do grupo de Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), que pretende se candidatar ao comando da Casa e busca se aproximar de bolsonaristas ligados à pauta anti-STF.
A PEC define que as chamadas decisões monocráticas não podem suspender a eficácia de uma lei ou norma de repercussão geral aprovada pelo Congresso e sancionada pela Presidência da República --para isso, obriga que haja decisões colegiadas.
Foram ajustados alguns trechos do texto original, com a retirada de um ponto que limitava o pedido de vistas em julgamentos --uma vez que a ex-ministra Rosa Weber já alterou o regimento do Supremo para restringir este dispositivo, que acabava postergando as decisões da corte.
Senado aprovou PEC que limita decisões individuais no Supremo
Por Carolina Pimentel
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), disse que as decisões individuais de um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) não podem se sobrepor ao Congresso Nacional e ao presidente da República.
A declaração ocorre após o Senado ter aprovado nessa quarta-feira (22) proposta de emenda à Constituição (PEC) que limita as decisões monocráticas (individuais) dos ministros da Corte Suprema e demais tribunais. Mais cedo, nesta quinta-feira (23), o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luís Roberto Barroso, disse que a proposta é desnecessária e não contribui para o Brasil.
"Estamos promovendo uma busca de equilíbrio entre os Poderes, para que uma lei, votada no Congresso Nacional, que é formado por representantes do povo brasileiro, não seja descontruída por um ato unilateral de uma pessoa, que por mais importância que tenha, como ministro do Supremo Tribunal Federal, não se sobrepõe ao Congresso Nacional, não se sobrepõe ao Presidência da República, não se sobrepõe ao colegiado da sua própria Casa", afirmou Pacheco.
De acordo com Pacheco, a proposta tem embasamento técnico, foi amplamente debatida com a sociedade e pelos senadores e busca equilíbrio entre os Poderes. Ele argumenta ainda que a própria Constituição prevê que declarações de inconstitucionalidade de leis devem ser tomadas pela maioria absoluta do colegiado do STF, o que não vem sendo, segundo ele, cumprido no país.
“Não podemos admitir que a individualidade de um ministro do Supremo Tribunal Federal declare inconstitucional uma lei sem a colegialidade do Supremo Tribunal Federal. Portanto, não admito que se queira politizar e gerar um problema institucional ao entorno de um tema que foi debatido com a maior clareza possível, que não constitui nenhum tipo de enfrentamento, nenhum tipo de retaliação, e nós jamais nos permitiríamos a fazer isso, porque é algo puramente técnico”, disse em entrevista à imprensa.
Pacheco afirmou, que como presidente do Senado, já defendeu o STF e seus ministros. Ele ressaltou que nenhum Poder detém monopólio para defesa da democracia nem é intocável.
“Quero dizer que nenhuma instituição tem o monopólio da defesa da democracia no Brasil. Aqui desse púlpito e do plenário do Senado Federal, eu, como presidente do Senado, defendi o Supremo Tribunal Federal, defendi a Justiça Eleitoral, defendi as urnas eletrônicas, defendi os ministros do Supremo Tribunal Federal, defendi a democracia do nosso país, repeli a todo o momento as arguições antidemocráticas”, disse. “Isso não significa que as instituições sejam imutáveis, intocáveis em razão de suas atribuições”, acrescentou.
Barroso
Além de considerar desnecessária a PEC aprovada pelo Senado, o presidente do STF afirmou nesta quinta-feira que a matéria "não contribui para a institucionalidade do país".
"O Supremo Tribunal Federal não vê razão para mudanças constitucionais que visem a alterar as regras de seu funcionamento. Num país que tem demandas importantes e urgentes, que vão do avanço do crime organizado à mudança climática que impacta a vida de milhões de pessoas, nada sugere que os problemas prioritários do Brasil estejam no Supremo Tribunal Federal", declarou.
O ministro Gilmar Mendes, decano do STF, disse que alterar as regras que garantem o funcionamento do Supremo pode ser considerado inconstitucional. Mendes também afirmou que a Corte não admite intimidações. "Esta Casa não é composta por covardes, não é composta por medrosos", concluiu.
Pela PEC, ficam proibidas decisões monocráticas para suspender leis ou atos dos presidentes da República, da Câmara dos Deputados e do Senado. As decisões para suspensão dessas normas devem ser tomadas de forma colegiada.
O texto segue para Câmara dos Deputados, onde não há prazo da votação da matéria. Para ser promulgada, a proposta também precisa ser aprovada em dois turnos no plenário da Casa.
Ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) classificaram a aprovação no Senado da PEC das decisões monocráticas como um "ataque" do Legislativo e afirmam que isso prejudica a interlocução da corte com o governo Lula, cuja atuação foi crucial para a aprovação da matéria, na avaliação de magistrados
POR JULIA CHAIB
O texto foi aprovado nesta quarta-feira (22) com 52 votos a 18, de 49 que eram necessários. O texto agora segue para avaliação da Câmara dos Deputados. No Senado, o líder do governo na Casa, Jaques Wagner (PT-BA), votou a favor da proposta.
Para ministros, o gesto de Wagner foi determinante para que o texto passasse, já que a matéria foi aprovada com apenas três votos de folga. Além do próprio voto, Wagner contribuiu para que mais alguns senadores se posicionasse a favor do texto.
A postura foi encarada como uma traição, e a interlocução de ministros com o governo fica prejudicada, segundo integrantes do STF. Ministros procuraram o senador para tentar entender a justificativa do voto.
O episódio provocou desconforto com a articulação política do Planalto, que também foi alvo de reclamações no Supremo.
O Planalto decidiu liberar a base para votar conforme a preferência por entender que a matéria não diz respeito ao governo.
Caso houvesse interferência, avaliaram articuladores políticos de Lula, isso poderia prejudicar a relação com o Senado, Casa que já tem apresentado entraves à agenda governista.
Em outra frente, se o governo se posicionasse a favor da matéria, criaria uma saia justa com o STF. Ainda assim, mesmo que tenha liberado a base, a postura de Wagner por si só gerou um problema.
"Eu me orgulho de ter participado de um movimento no sentido de minimizar ou diminuir as diferenças que poderiam incomodar ou serem interpretadas equivocadamente como uma intromissão do Legislativo na corte superior", afirmou o senador do PT.
Wagner foi o único dos oito senadores do PT a votar pela aprovação da proposta. Ao contrário dele, o líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), votou contra a aprovação da PEC e a criticou durante discurso nesta terça-feira.
"Não há outra definição para ela [a proposta]. Ela é uma reação a sobretudo ao papel histórico que o Supremo Tribunal Federal cumpriu", afirmou Randolfe.
A PEC define que as chamadas decisões monocráticas não podem suspender a eficácia de uma lei ou norma de repercussão geral aprovada pelo Congresso e sancionada pela Presidência da República --para isso, obriga que haja decisões colegiadas.
Foram ajustados alguns trechos do texto original, com a retirada, por exemplo, de um ponto que limitava o pedido de vistas em julgamentos --uma vez que a ex-ministra Rosa Weber já alterou o regimento do Supremo para restringir este dispositivo, que acabava postergando as decisões da corte.
Outra mudança que atenuou a proposta original foi a exclusão do escopo da PEC das decisões da Presidência da República, como decretos ou nomeações, que estavam previstas inicialmente.
Na prática, avaliam ministros do STF, a proposta não deve ter muita repercussão prática no Supremo, já que o regimento prevê que decisões liminares dos magistrados precisam ser confirmadas pelos outros membros no plenário virtual em até 90 dias.
O problema, apontam magistrados, é o simbolismo da aprovação. O texto foi classificado como um cavalo de troia por um ministro, na intenção de dizer que esta é apenas a primeira de uma série de outras medidas que miram o STF e serão pautadas.
A expectativa é que o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), segure ou ao menos dê ritmo lento à proposta na Câmara.
A ofensiva contra o Supremo foi sempre esteve presentes entre senadores aliados a Jair Bolsonaro (PL). Ela ganhou tração, porém, a partir de uma articulação entre o Senado e a oposição na Câmara, impulsionada pela bancada ruralista, a mais forte do Congresso no momento.
Coube ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), acelerar a articulação da proposta e pautá-la.
A atuação dele, em conjunto com a de Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), tem sido vista por parlamentares como uma movimentação do grupo de que pretende se candidatar ao comando da Casa e busca se aproximar de bolsonaristas ligados à pauta anti-STF.
Como é
Ministros do STF podem deliberar monocraticamente sobre qualquer tema envolvendo os outros Poderes e instâncias administrativas; mudança recente no regimento interno da corte definiu que decisões liminares dos magistrados precisam ser confirmadas pelos outros membros no plenário virtual em até 90 dias
Como ficaria
Se aprovada, a proposta proibirá decisões monocráticas para suspender eficácia de lei aprovada pelo Congresso e sancionada pela Presidência; somente o presidente da corte, atualmente Luís Roberto Barroso, poderia decidir monocraticamente e durante o período de recesso judiciário, com análise do resto do tribunal em até 30 dias após o retorno das atividades
Retirado da PEC
Uma mudança feita foi excluir do escopo da PEC as decisões da Presidência da República, como decretos ou nomeações, que estavam previstas inicialmente