Governo federal cogita alegar inconstitucionalidade; desoneração permite que empresas paguem impostos sobre receita bruta
Por Ana Isabel Mansur e Emerson Fonseca Fraga
A prorrogação da desoneração da folha de pagamento de 17 setores da economia até 2027 está de acordo com a Constituição Federal, dizem especialistas em direito tributário consultados pelo R7. O veto presidencial por esse motivo, portanto, "não seria justificável". O tema já foi discutido no Supremo Tribunal Federal. Em 2021, o ministro aposentado Ricardo Lewandowski, então relator do caso, posicionou-se a favor da medida e afirmou que a reoneração levaria a inúmeras demissões (veja mais abaixo). O projeto de lei com a extensão da medida fiscal, que terminaria em 31 de dezembro deste ano, foi aprovado pelo Congresso Nacional em outubro e aguarda sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Pela matéria, a contribuição previdenciária de 20% sobre a folha salarial continua sendo substituída por uma contribuição com alíquota entre 1% e 4,5% da receita bruta das empresas.
Com risco de perda de 1 milhão de vagas, empresas e trabalhadores pressionam o governo federal a sancionar o projeto de lei. Na semana passada, no entanto, o ministro da Secretaria de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, em resposta a questionamento feito pelo R7, afirmou que “não há compromisso” com a sanção da desoneração.
Padilha declarou que o governo vai analisar a medida, principalmente no que diz respeito à constitucionalidade. O ministro levantou a hipótese de o texto aprovado pelo Congresso Nacional não estar de acordo com a Constituição Federal, o que é refutado por especialistas.
Nesta quinta-feira (9), quase 30 representações patronais assinaram em conjunto um ofício para pedir audiência com Lula para expor "com maior profundidade os elementos que fundamentam a necessária sanção da medida". As centrais sindicais também pressionam pela prorrogação.
Aquece economia
O advogado tributarista Renato Aparecido Gomes diz que o projeto que prorroga a desoneração é constitucional. "Representantes do governo federal têm alegado que a medida fere a Constituição, em razão da existência de uma nova disposição, a emenda à Constituição 103, de 2019, que proíbe novo regime de previdência. Não se trata, contudo, de um novo regime, mas da prorrogação de um sistema que vem funcionando desde 2011", explica.
"A lei que criou a desoneração da folha vem sendo alterada, prorrogando essa desoneração, que, de certa forma, compreende uma necessidade de determinados setores para possibilitar mais contratação e maior oferta de empregos", argumenta.
Para o especialista, a desoneração aquece a economia. "Muitas vezes, o fato de você diminuir a tributação de um determinado setor incentiva tanto aquela atividade econômica, e essa atividade fica tão aquecida pela quantidade de atividades que a tributação, embora menor, acaba resultando numa maior arrecadação", diz.
Veto ‘não seria justificável’
O advogado tributarista e conselheiro da Associação Brasileira da Advocacia Tributária (Abat) Eduardo Natal concorda com o colega. "A prorrogação não é a criação de um novo tributo, é simplesmente a própria prorrogação. É a continuidade da incidência na forma que já estaria disciplinada por mais algum tempo. Portanto, esse argumento de inconstitucionalidade não deveria subsistir", afirma.
O especialista disse que um veto por inconstitucionalidade "não seria justificável". "Essa contribuição cobrada para esses sete setores na forma de desoneração da folha existe desde 2011. Não é uma novidade. Portanto, também não se configuraria como uma renúncia de receita, como algo que viesse já ingressando no caixa do governo federal nos últimos exercícios", afirma.
A demora do presidente Lula (PT) em escolher o sucessor de Rosa Weber no STF (Supremo Tribunal Federal) faz a investigação que mira o ministro das Comunicações, Juscelino Filho (União Brasil-MA), estar sem relator desde o mês de setembro
Com Folhapress
O caso se refere a supostos crimes praticados quando o ministro era deputado federal pelo Maranhão.
O inquérito da operação Odoacro investiga o suposto desvio de dinheiro público em obras da Codevasf, estatal comandada pelo centrão, bancadas com emendas parlamentares e que tinha como relator o atual presidente o STF, Luís Roberto Barroso.
Com sua ida para a presidência da corte, a maioria do acervo de Barroso foi repassado para a ministra Rosa Weber. Após sua aposentadoria, em setembro, o caso ficou sem relator.
A petição registrada no sistema do STF ainda traz o nome de Rosa Weber como relatora, mas com sua aposentadoria, na prática, o caso não tem um juiz responsável.
De acordo com apuração da reportagem, na PF a equipe de investigação do caso ainda trabalha na análise do material apreendido na operação realizada no início de setembro e que chegou a afastar a irmã de Juscelino Filho, Luanna Rezende, do cargo de prefeita de Vitorino Freire, no Maranhão.
O ministro das Comunicações chegou a ter um pedido de busca e apreensão contra ele feito pela PF, mas negado por Barroso.
A vaga no STF está aberta desde o final de setembro, quando a ministra Rosa Weber se aposentou. Ela fez 75 anos em outubro, idade-limite para integrantes da corte.
Em conversa com jornalistas, no dia 27 de outubro, Lula disse que indicará o novo nome para o STF ainda neste ano.
Aliados do presidente admitem que no terceiro mandato Lula tem adotado estilo mais centralizador, o que tem atrasado determinadas decisões. Um dos cotados para a vaga de Rosa é o ministro da Justiça, Flávio Dino (PSB).
O empresário conhecido como Eduardo DP, sócio oculto da Construservice, empreiteira que está no centro de suspeitas de corrupção com verbas da estatal federal Codevasf, manteve relações políticas no Maranhão com aliados do ministro.
A empresa também foi uma das maiores beneficiadas por verbas para obras de pavimentação no período em que o atual ministro da Justiça, além de seu vice, Carlos Brandão (PSB), governaram o estado recebeu cerca de R$ 710 milhões de 2015 a 2022.
Em dezembro do ano passado, a Folha questionou Dino sobre obras da Construservice no Maranhão, durante entrevista do ex-governador ao programa Roda Viva. "No nosso período não houve nenhuma denúncia em nível estadual", disse Dino.
No caso de Juscelino Filho, companheiro de Esplanada de Dino, a PF aponta que ele estabeleceu uma relação criminosa com Eduardo DP.
Mensagens reveladas pela Folha, para os investigadores da PF, reforçam a "atuação criminosa de Juscelino Filho" e demonstram que a "sua função na Orcrim (organização criminosa) era conhecida por todos os membros" do suposto grupo chefiado pelo empresário.
"Resta cristalina a relação criminosa pactuada entre Juscelino Filho e Eduardo DP", diz trecho de um relatório da PF. De acordo com o documento enviado ao STF, o grupo do ministro foi responsável por "suposto desvio ou apropriação e uso indevido de, no mínimo, R$ 835,8 mil".
As conversas também mostram o ministro de Lula, à época deputado federal, tratando da destinação de emendas, execução de obras e pagamentos a terceiros.
No inquérito, a PF lista uma série de conversas entre Juscelino Filho e o empresário Eduardo DP nas quais o ministro indica nomes, contas e empresas como destinatários de valores que seriam transferidos.
Em 18 de janeiro de 2019, por exemplo, o então deputado federal envia o nome de uma pessoa e valor de R$ 9,4 mil. Um dia depois, o empresário responde com o recibo do depósito efetuado.
Para fazer a transferência, Eduardo DP pede ao irmão, que é o responsável pela parte financeira da Construservice. Em um áudio, ele afirma: "Isso é do Juscelino lá de Vitorino, o Deputado, faz isso aí, que a terraplanagem daquela pavimentação quem fez foi ele, é pra descontar, viu?"
O presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Luís Roberto Barroso, rejeitou um recurso da União contra decisão que determinou o pagamento de R$ 50 mil em indenização por danos morais ao advogado Roberto Teixeira, que defendeu o presidente Lula (PT) em processos da Lava Jato
POR JOSÉ MARQUES
O pagamento da quantia foi determinado em abril do ano passado pelo TRF-3 (Tribunal Regional Federal da 3ª Região).
O tribunal havia considerado irregular a autorização do ex-juiz Sergio Moro -hoje senador- para que a Polícia Federal fizesse interceptação telefônica no celular de Teixeira e, posteriormente, a retirada do sigilo das comunicações.
Roberto Teixeira, amigo e compadre de Lula, é sogro do ministro Cristiano Zanin, que advogava para o presidente antes de ser indicado pelo presidente ao Supremo, em junho.
Na decisão do STF, Barroso entendeu que para revisar o entendimento do TRF-3 "seria necessário reexaminar os fatos e as provas dos autos", e que isso não é cabível por meio do recurso apresentado pela União. O despacho foi assinado na sexta-feira (3).
A ação de indenização a Roberto Teixeira tinha sido apresentada inicialmente em 2016 pelo próprio Zanin.
Ele apontou que Moro tornou públicos os conteúdos das gravações e que havia assuntos estritamente pessoais e privados de Teixeira, com família, amigos e colaboradores.
Havia, ainda, conversas entre Teixeira e Lula, na relação entre cliente e advogado.
"O juiz federal expôs, indevidamente, a privacidade, a imagem, a honra e as prerrogativas profissionais do autor, causando-lhe danos morais que deverão ser indenizados", disse Zanin no pedido.
Segundo ele, "além de grampear todas as conversas do autor, advogado, com o seu cliente, o [à época] ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o que, por si só, é repudiável, o juiz Sergio Moro tratou de divulgá-las ao público em geral, antes de qualquer contraditório ou até mesmo da análise judicial desse material".
Ao recorrer, a União, por meio da AGU (Advocacia-Geral da União), afirmou que à época dos grampos "havia indícios razoáveis da autoria ou participação do autor [Roberto Teixeira] em infração penal".
"Além disso, não havia outro meio de investigação mais eficaz do que a interceptação telefônica, tendo em vista a complexidade dos fatos investigados, bem como a engenhosidade que se apurava. Por fim, como já dito, os fatos investigados são punidos com pena de reclusão (lavagem de dinheiro e corrupção são punidos com pena de reclusão)", acrescentou.
"Dessa maneira, diante da suspeita verificada pelos procuradores, foi solicitado ao juiz Sergio Moro a interceptação telefônica do sr. Roberto Teixeira, que fundamentadamente decidiu, diante da presença dos requisitos legais."
Ao decidir sobre o caso no ano passado, o TRF-3 apontou que o Supremo já havia questionado o procedimento adotado por Moro.
"Considero que o levantamento do sigilo das conversas interceptadas -uma das condutas maculadas pela seletividade do ex-magistrado Sergio Fernando Moro, conforme entendimento do STF- repercutiu na esfera da personalidade do autor e transcendeu o mero aborrecimento, violando o patrimônio imaterial do requerente, no âmbito das suas relações de direito privado", disse na ocasião o relator, o juiz Helio Egydio Nogueira.
Paulinho da Força, primeiro suplente pode assumir a vaga
Por Andre Richter
Por 5 votos a 2, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) cassou nesta terça-feira (7) o mandato do deputado federal Marcelo de Lima Fernandes (PSB-SP), eleito nas eleições de 2022. Ele recebeu cerca de 110 mil votos.
Com a decisão, a Justiça Eleitoral de São Paulo será comunicada para realizar a totalização dos votos. O resultado do julgamento abre caminho para que o ex-deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP), primeiro suplente da legenda, possa assumir a cadeira, no entanto, a decisão final será do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) de São Paulo.
O julgamento foi motivado por uma ação de perda de mandato apresentada pelo Solidariedade contra Fernandes. De acordo com o partido, o parlamentar saiu do partido em fevereiro deste ano sem apresentar justa causa exigida pela legislação eleitoral.
Na defesa apresentada ao tribunal, Marcelo Lima afirmou que deixou o Solidariedade após o partido não ter atingido a cláusula de barreira nas eleições de 2022, número mínimo de parlamentares para ter acesso ao fundo partidário e tempo de propaganda. O requisito é uma das justas causas para desfiliação partidária.
O julgamento começou em agosto e foi finalizado na sessão de hoje. A maioria dos ministros seguiu voto proferido pelo relator, ministro André Ramos Tavares.
No entendimento do ministro, apesar de não ter atingido a cláusula de barreira, o Solidariedade promoveu uma fusão com o Pros e passou a cumprir a cláusula.
Dessa forma, a justa causa para desfiliação deixou de valer para o parlamentar.
Além disso, o deputado só comunicou a Justiça Eleitoral sobre sua desfiliação no dia seguinte após a incorporação dos partidos.
Cabe recurso contra a decisão do TSE. A Câmara dos Deputados também será comunicada sobre a sentença.
No que se refere ao contexto específico da disputa eleitoral, já é certo que o Congresso não aprovará novas regras, já que pelo princípio da anualidade eleitoral, o que vale para 2024 teria que ter sido votado e sancionado até 5 de outubro, o que não ocorreu
POR RENATA GALF
Em 2021, a Câmara aprovou um novo Código Eleitoral, que também incluiu a temática da campanha na internet e envolveu propostas polêmicas ao longo de sua discussão.
Amplo e alvo de críticas em mais de uma frente, o projeto não andou no Senado. Já a minirreforma eleitoral encampada pela Câmara perto do limite do prazo nem sequer tratou do assunto.
Um outro caminho, que serviria para aumentar as obrigações das plataformas, é o projeto de lei 2.630, que ficou conhecido como PL das Fake News.
As últimas versões da proposta previam mais responsabilidade para as empresas por aquilo que nelas circula, em especial sobre conteúdo pago, além de trazer uma série de requisitos de transparência.
Em um cenário em que o PL 2.630 não avance, o Legislativo deixará mais uma vez um vácuo que provavelmente será ocupado pela Justiça Eleitoral.
O presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), ministro Alexandre de Moraes, fez cobranças recentemente sobre o assunto, assim como o presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), ministro Luís Roberto Barroso.
Yasmin Curzy, professora de direito da FGV-Rio, vê a inação sobre o tema como uma omissão do Legislativo e destaca que muitos dos mecanismos existentes hoje são usados para lidar com casos individuais, defendendo a importância de uma regulação ampla, que avance por exemplo nas obrigações de transparência e sobre as políticas das plataformas.
"Há necessidade urgente de atualizar e especificar a legislação para tratar adequadamente da questão da desinformação em eleições, levando em consideração a complexidade e a escala do problema no ambiente digital", diz.
Criticado por parte dos parlamentares por ultrapassar os limites de suas competências, o TSE vem nos últimos anos fazendo uso das resoluções para preencher lacunas.
"A Lei das Eleições, que protege do fato sabidamente inverídico, é uma lei de 1997, então é uma regulamentação na temática das eleições totalmente analógica", diz Anna Paula Mendes, professora de direito eleitoral e coordenadora acadêmica da Abradep (Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político).
Ela afirma que mecanismos como direito de resposta não foram revisitados e não são o desenho mais adequado para lidar com a questão. "Foi uma legislação pensada com a cabeça de outro momento", diz.
Por meio de resoluções, o TSE vetou disparos em massa e também a divulgação de fatos gravemente descontextualizados, para além dos sabidamente inverídicos.
O prazo para a corte editar resoluções para 2024 termina em 5 de março. Até lá, o tribunal terá que definir o que será feito da polêmica resolução que foi aprovada entre o primeiro e o segundo turno da eleição do ano passado.
Em 2022, em um pleito que convivia com o constante pano de fundo de risco à própria democracia, em meio à uma engendrada campanha de fake news contra as urnas eletrônicas, o tribunal mudou as regras do jogo, a dez dias da eleição, e ampliou seu poder de retirar conteúdos inverídicos e descontextualizados sobre a integridade eleitoral, mesmo sem ser acionado.
Também diminuiu para duas horas o prazo para as big techs excluírem as publicações, sob pena de multa de R$ 100 mil por hora e restringiu a veiculação de anúncios políticos desde 48 horas antes do pleito.
Em relação à presidência do TSE, previu a possibilidade de remover conteúdos idênticos sobre os quais já houvesse decisão anterior, suspender perfis, contas e canais temporariamente em caso de publicação contumaz de informações falsas ou descontextualizadas, e até mesmo a suspensão das plataformas em caso de descumprimento reiterado de ordens.
Diogo Rais, professor de direito eleitoral e digital na Universidade Mackenzie, considera que do modo como a resolução está, não seria possível aplicá-la na eleição municipal.
Ele avalia que o TSE nem sequer teria condições de lidar com o volume da eleição municipal, para manter os poderes concentrados nele, tampouco repassar a tarefa aos Tribunais Regionais Eleitorais é visto como alternativa.
"Descentralizar, por exemplo, para 27 TREs pode fazer com que a gente tenha muita incongruência ou até uma dificuldade de operacionalização", diz.
Outra frente de ação do TSE se deu com a assinatura de convênios com as principais redes sociais e plataformas, junto da criação de um programa de desinformação, com uma assessoria especial responsável por tocá-lo.
Entre os aspectos considerados positivos dos acordos estão o de tornar mais ágil o contato entre a equipe do TSE e as empresas, com a criação de canais para envio direto de links suspeitos.
Os acordos não abrangeram que tipo de conteúdo deve ou não ser removido, algo definido pelas políticas de cada empresa. Ficou previsto, porém, que elas deveriam publicar regras sobre integridade cívica.
As lacunas das regras em relação ao cenário brasileiro, entretanto, já vinham sendo apontadas por especialistas e pela sociedade civil meses antes da eleição. Apenas após o segundo turno, por exemplo, o Facebook e o Instagram passaram a remover postagens com pedidos de intervenção militar no Brasil.
Francisco Brito Cruz, diretor-executivo do Internet Lab, a principal lacuna na legislação está na falta de obrigações para as plataformas, para além de cumprir decisões judiciais, e vê no PL 2630 avanços para a eleição.
Ele vê porém que ainda é possível inovar e avançar no âmbito dos acordos de cooperação, na questão de como as plataformas elaboram e interpretam suas regras.
"As plataformas estão dispostas a discutir as suas políticas de uso nessa discussão de cooperação?", diz ele que vê as resoluções como um caminho para incluir participação social nessa discussão sobre as políticas e até mesmo alguns elementos de transparência.
Procurado pela reportagem, o tribunal informou que ainda não há calendário definido para as audiências públicas para tratar das próximas resoluções.