Aposta do governo para aumentar arrecadação, projeto vai à sanção
Por Carolina Pimentel e Wellton Máximo
Os senadores aprovaram na tarde desta quinta-feira (29) o projeto de lei que muda a tributação de rendas obtidas com fundos exclusivos de investimento e offshores - empresas no exterior que administram fundos de investimentos. O texto segue para sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
A taxação é uma das principais apostas do governo federal para aumentar a arrecadação de impostos, elevando os tributos dos mais ricos do Brasil. No parecer, o relator do projeto, senador Alessandro Vieira (MDB-SE), estima montante de R$ 13 bilhões somente em 2024.
Pelo projeto aprovado, as regras dos fundos exclusivos serão igualadas às dos demais fundos. Com isso, os super-ricos pagarão o “come-cotas” (recolhimento periódico do imposto de renda) a partir de 2024 de 15% sobre o rendimento para fundos de longo prazo, sendo 20% no caso dos investimentos de até 1 ano (curto prazo). Os fundos serão tributados a cada 6 meses.
Atualmente, apenas 2,5 mil brasileiros aplicam em fundos exclusivos, que somam R$ 756 bilhões em patrimônio e respondem, sozinhos, por 12,3% da indústria de fundos do Brasil.
Em relação aos fundos offshores, muito usado por investidores super-ricos que entregam bens no exterior para terceiros administrarem, o projeto prevê uma cobrança anual de 15% de IR a partir de 2024. A tributação será feita uma vez ao ano, no dia 31 de dezembro.
Hoje, quem tem dinheiro em offshore só paga 15% de IR sobre o ganho de capital quando e se o dinheiro voltar ao Brasil.
Confira o projeto aprovado:
Fundos exclusivos
• Como funciona atualmente: tributação apenas no momento do resgate do investimento;
• Instrumento: originalmente era medida provisória, mas texto foi incorporado a projeto de lei;
• Tributação: alíquota de 15% (fundos de longo prazo) ou de 20% (fundos de curto prazo, de até um ano) de Imposto de Renda sobre os rendimentos uma vez a cada semestre por meio do mecanismo chamado “come-cotas” a partir do ano que vem. Fundos com maiores prazos de aplicação têm alíquotas mais baixas por causa da tabela regressiva de Imposto de Renda;
• Atualização antecipada: quem optar por começar a pagar o “come-cotas” em 2023 pagará 8% sobre o estoque dos rendimentos (tudo o que rendeu até 2023). O governo propôs dois modelos de pagamento:
– 8% para quem parcelar em quatro vezes, com a primeira prestação a partir de dezembro. Na medida provisória, o governo tinha proposto alíquota de 10% nessa situação;
– 15% para quem parcelar em 24 vezes (dois anos), com primeira prestação a partir de maio de 2024.
Offshore e trusts
• Como funciona atualmente: recursos investidos em offshores, empresas no exterior que abrigam fundos de investimentos, só pagam 15% de Imposto de Renda sobre ganho de capital se voltarem ao Brasil.
• Instrumento: projeto de lei.
• Tributação: 15% de cobrança anual de rendimentos a partir de 2024, mesmo se dinheiro ficar no exterior. Governo tinha proposto alíquotas progressivas de 0% a 22,5%, conforme os rendimentos anuais.
• Apuração: lucros das offshores serão apurados até 31 de dezembro de cada ano.
• Forma de cobrança: tributação dos trusts, relação jurídica em que dono do patrimônio transfere bens para terceiros administrarem.
• Como funcionam os trusts: atualmente, legislação brasileira não trata dessa modalidade de investimento, usada para reduzir o pagamento de tributos por meio de elisão fiscal (brechas na legislação) e facilitar distribuição de heranças em vida.
• Atualização antecipada: quem optar por atualizar o valor do estoque dos rendimentos (tudo o que rendeu até 2023) pagará menos. Nesse caso, a adesão é voluntária. O governo propôs dois modelos de pagamento:
– 8% para quem parcelar em quatro vezes, com a primeira prestação a partir de dezembro. Na medida provisória, o governo tinha proposto alíquota de 10% nessa situação;
– 15% para quem parcelar em 24 vezes (dois anos), com primeira prestação a partir de maio de 2024.
• Variação cambial: lucro com alta do dólar não será tributado em duas situações:
– variação cambial de depósitos em conta corrente ou em cartão de crédito ou débito no exterior, desde que os depósitos não sejam remunerados;
– variação cambial de moeda estrangeira para vendas de moeda de até US$ 5 mil por ano.
Fiagro e fundos de investimentos imobiliários
• Definição: Fiagros são fundos de investimento em cadeias agroindustriais, fundos de investimentos imobiliários são fundos que aplicam em imóveis.
• Como funciona atualmente: fundos com pelo menos 50 cotistas e com cotas negociadas na bolsa de valores ou em mercados de balcão de derivativos têm isenção de Imposto de Renda.
• O que muda: para obter isenção de IR, número mínimo de cotistas sobe para 100, com limite de cotas entre familiares a 30% do patrimônio líquido total, incluindo parentes até o segundo grau. Receita Federal tinha proposto 500 cotistas, depois reduziu proposta para 300.
• Impacto: segundo relator, de 70 fundos do tipo, apenas quatro perderiam a isenção do IR.
Parlamentares da oposição se preparam para tentar barrar indicação de Lula ao Supremo
Por Guilherme Resck
A sabatina do atual ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado deverá contar com indagações de senadores oposicionistas sobre os diferentes momentos da carreira do indicado por Lula (PT) ao Supremo Tribunal Federal, que tem um período como juiz e outro como político, e se ele agiu corretamente durante o ataque às sedes dos Três Poderes em 8 de janeiro.
O SBT News apurou que o líder da bancada do Partido Liberal (PL) no Senado, Carlos Portinho (RJ), membro titular da CCJ, focará em demonstrar na sabatina, recuperando a carreira de Dino, que ele não possui notório saber jurídico - um dos requisitos constitucionais para ser ministro do Supremo. Os senadores do Partido Liberal são contra a indicação. Quatro dos membros titulares da CCJ são da sigla: além de Portinho, Flávio Bolsonaro (RJ), Magno Malta (ES) e Marcos Rogério (RO).
"Espera-se de um ministro da Suprema Corte uma postura de equilíbrio, serenidade e capacidade para dialogar e se manter distante de paixões políticas e ideológicas. Não é o caso de Flávio Dino. Nunca antes na história do Brasil vimos um ministro com tamanho apego ideológico", argumentou Marcos Rogério no X, nesta 3ª feira (28.nov). Ainda na rede social, na 2ª feira (27.nov), quando Dino foi indicado, Magno Malta afirmou que trabalhará "ativamente para conseguir mais votos contrários" à aprovação.
Na mesma data, Flávio Bolsonaro fez uma publicação chamando de "descaramento e um absurdo" indicar Dino ao Supremo. "A Suprema Corte precisa de gente qualificada e técnica, não de um político profissional que vai usar todos os seus poderes para proteger os esquemas do PT e os amigos, além de fazer avançar as pautas da esquerda como aborto e legalização de drogas", acrescentou.
Flávio ainda acusou Lula e Dino de serem ameaçadas à democracia do Brasil disse que "o STF não pode ser um órgão político, a Corte dos amigos". "Isso é inadmissível numa democracia. Lula indicar um AMIGO extremamente íntimo é um atrevimento gigantesco com o Congresso Nacional e com o Brasil. Cobre o seu parlamentar para que este absurdo não passe no Senado!".
Apesar de o PL já ter anunciado que seus senadores votarão contra a indicação e outros senadores oposicionistas já terem afirmado que votarão contra também, como Damares Alves (Republicanos-DF) e Eduardo Girão (Novo-CE), o posicionamento, ao menos por enquanto, não é unanimidade na oposição.
Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) disse à reportagem que ainda está analisando a indicação. "Não tenho um juízo ainda sobre esse assunto".
Ele também é titular da CCJ. Questionado se acredita que Dino será indagado na sabatina sobre sua atuação no 8 de janeiro, pontuou: "Alguns vão perguntar sobre isso".
Zequinha Marinho (Podemos-PA), suplente da CCJ, disse considerar fundamental que a oposição questione, na sabatina, se Dino vai deixar "a questão política e ideológica e se concentrar só na questão legal" caso se torne ministro do Supremo.
O SBT News perguntou a ele ainda como avalia a indicação, se positiva ou negativa. Em resposta, pontuou: "O governo trabalha com o melhor que ele tem. Uma vaga dessa aí é uma vaga única. O governo tem que botar alguém da sua inteira confiança. E acho que ele fez da forma que ele achou correta. Direito de todo mundo democraticamente a aceitar ou não aceitar, querer ou não querer. Acho que o governo fez a parte dele".
Hamilton Mourão (Republicanos-RS), que já anunciou que votará contra a indicação, disse que "provavelmente" o tema da atuação de Dino no 8 de janeiro será abordado durante a sabatina. Ao menos parte da oposição no Congresso defende que o Governo Federal agiu com omissão no episódio. Na CPMI dos Atos de 8.jan, oposicionistas, incluindo suplentes da CCJ, chegaram a apresentar votos em separado defendendo essa tese e pedindo o indiciamento de Flávio Dino.
Tema em almoço
A sabatina de Dino, que está marcada para 13 de dezembro, foi um dos temas discutidos por senadores oposicionistas, incluindo Portinho, em almoço realizado nesta 3ª feira, em Brasília. Os parlamentares fazem o almoço toda 3ª, para discutirem pautas.
Placar
Dino precisa de no mínimo 14 votos favoráveis na CCJ para que sua indicação seja aprovada pelo colegiado. A votação é secreta. Nesta 3ª, o senador Weverton (PDT-MA), relator da indicação do ministro, apostou que serão de 17 a 20 votos favoráveis. No plenário, depois, ele precisa de pelo menos 41, e Weverton estima que serão mais de 50. Recentemente, porém, o plenário rejeitou uma indicação de Lula para a Defensoria Pública da União (DPU).
Idas ao Congresso
Dino está acostumado a responder questionamentos de parlamentares cara a cara: ele participou de diversas reuniões em comissões do Senado e Câmara neste ano, devido à aprovação de requerimentos de convite e convocação.
Respostas dele durante essas participações chegaram a viralizar na internet. Por exemplo, quando disse para o senador Marcos do Val (Podemos-ES) que se o parlamentar era da Swat, ele (Dino) era dos Vingadores.
Caso trata de uma entrevista dada em 1995 em que ex-deputado federal foi identificado como participante de atentado a bomba
Por Ana Isabel Mansur - R7
O Supremo Tribunal Federal (STF) julga na próxima quarta-feira (29) um recurso extraordinário que, na prática, pode levar ao cerceamento da liberdade de imprensa e à autocensura de veículos de comunicação, como afirmam especialistas em direito constitucional ouvidos pelo R7. A determinação dos ministros tem repercussão geral, ou seja, será regra em outros casos parecidos.
A ação trata de publicação em matéria jornalística de atos inverídicos. Em agosto, a Corte decidiu que veículos de imprensa podem ser responsabilizados civilmente por declarações de terceiros publicadas. Agora, os ministros precisam deliberar a tese da ação. Durante a votação, em agosto, não houve consenso sobre as circunstâncias que podem causar punição.
O recurso extraordinário é relativo a um episódio de 1995. À época, o jornal Diário de Pernambuco publicou uma reportagem na qual o entrevistado acusava o então deputado federal Ricardo Zarattini, morto em 2017, de participar de um atentado a bomba no aeroporto do Recife, em julho de 1966. O episódio matou duas pessoas e feriu outras 14. Zarattini foi inocentado das acusações que envolveram o caso, na década de 1980. A ação em análise pelo STF foi aberta pelo ex-parlamentar contra o noticiário.
Na primeira instância, o Diário de Pernambuco foi condenado a indenizar o ex-deputado em R$ 700 mil por danos morais. O periódico entrou com recurso, e a segunda instância reverteu a decisão para considerar o pedido de Zarattini improcedente. Em análise no Superior Tribunal de Justiça (STJ), a decisão foi favorável ao ex-parlamentar, mas reduziu o pagamento para R$ 50 mil.
O caso chegou ao STF em setembro de 2017, com relatoria do ministro Marco Aurélio Mello, que se aposentou da Corte, em 2021. Ele decidiu, antes de sair do Supremo, que "empresa jornalística não responde civilmente quando, sem emitir opinião, veicule entrevista na qual é atribuído, pelo entrevistado, ato ilícito a determinada pessoa".
O R7 entrou em contato com o deputado federal Carlos Zarattini (PT-SP), filho do ex-parlamentar Ricardo Zarattini, mas não ainda recebeu retorno.
Segundo o advogado especialista em direito constitucional Acácio Miranda, há duas possibilidades em jogo — a responsabilização conjunta do jornal e do entrevistado e um caminho intermediário. Para ele, o primeiro caso pode causar "prejuízos à liberdade de imprensa e manifestação".
"Significa que o órgão de imprensa será corresponsável pelas informações transmitidas. É uma posição preocupante, porque revela, mesmo que indiretamente, um viés de censura. Impõe certo temor aos veículos de imprensa, e, obviamente, pelo menos os mais sérios, dificilmente vão compartilhar informações sob esse risco. A segunda alternativa mantém a responsabilização, mas não prevê uma indiscriminada", avalia o especialista.
Na segunda hipótese, a responsabilização seria apenas do entrevistado, com inclusão da empresa jornalística "quando ela tivesse ciência que as informações transmitidas eram inverídicas ou erradas ou quando a empresa não consultou a fonte". "É o melhor caminho, só vai responsabilizar o veículo de informação quando há omissão ou equívoco deliberado do jornalista e o veículo acompanha", completa.
Se você responsabilizar o veículo de informação de forma objetiva, sem que soubesse [da informação falsa], você está indiretamente criando uma forma de censura. Se você responsabilizar indistintamente o veículo de informação, obviamente ele terá receio. E, das duas, uma: ou disponibiliza a informação e paga para ver ou, o que é mais condizente com as nossas circunstâncias, não vai publicar.
ACÁCIO MIRANDA, ADVOGADO ESPECIALISTA EM DIREITO CONSTITUCIONAL
A coordenadora de Incidência da Repórteres sem Fronteiras (RSF) para a América Latina, Bia Barbosa, avalia que, a depender da tese geral, pode haver impactos irreversíveis para o cotidiano das redações e para o direito de acesso à informação pela população. "As entrevistas são fundamentais para o ofício da atividade jornalística. Basta a gente lembrar de episódios históricos — o do Pedro Collor [irmão caçula do ex-presidente Fernando Collor, autor das acusações contra o tesoureiro PC Farias, que levaram à abertura do processo de impeachment do ex-presidente] e a do Roberto Jefferson [ex-deputado que delatou o esquema do Mensalão], que tiveram um impacto muito grande nos rumos do país e revelaram fatos fundamentais", defende.
Para a coordenadora, as falas de terceiros publicadas em jornais podem ser o ponto central da reportagem. "É claro que entrevistados podem dar declarações polêmicas e até questionáveis, mas, nesses casos, muitas vezes as próprias declarações viram notícia, principalmente se forem feitas ou envolverem figuras públicas. Responsabilizar indiscriminadamente os meios de comunicação pelo que dizem os seus entrevistados pode gerar muitas consequências do ponto de vista de autocensura", observa.
Bia concorda com o colega advogado em relação ao risco de autocensura. "No jornalismo atual, a gente já vive um quadro de assédio judicial crescente, praticado, principalmente, por autoridades para silenciar o exercício jornalístico. Se a tese do STF for no sentido de responsabilizar permanentemente os meios de comunicação por qualquer fala de entrevistados, o risco de os processos se multiplicarem vai gerar, necessariamente, essa autocensura", avalia.
"Pressupor que, para fazer uma entrevista, inclusive ao vivo, os jornalistas tenham que controlar previamente toda e qualquer declaração a ser feita pelos entrevistados gera risco de autocensura", analisa.
A especialista defende a ideia de que o entendimento do STF considere alguns pontos. "Se é ao vivo ou numa entrevista publicada depois, o que permite análise posterior do que o entrevistado disse; considerar a quais informações o jornalista poderia, razoavelmente, ter acesso no momento da apuração e da publicação; e, principalmente, qual foi a posição que o meio de comunicação teve diante das declarações — se, por exemplo, deu espaço ao contraditório, se eventualmente corrigiu ou contextualizou uma informação dada pelo entrevistado", lista.
O advogado e cientista político Nauê Bernardo acredita que o STF não arriscará a autocensura dos meios de comunicação. "O Supremo tem uma linha bem sólida de defesa da liberdade de imprensa. Então é difícil acreditar que esse entendimento vai permitir um cerceamento da liberdade de imprensa. O Supremo Tribunal Federal sempre teve muito cuidado com esses aspectos, e, inclusive, isso ficou expresso em julgamentos mais recentes, como aquele do direito ao esquecimento. Sou cético quanto à possibilidade de o Supremo cercear a liberdade de imprensa", avalia.
Os ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) apostam no presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), para barrar o avanço da PEC (proposta de emenda à Constituição) que limita as decisões individuais na corte.
POR MATHEUS TEIXEIRA
A matéria foi aprovada no Senado na quarta-feira (22) e determina que apenas o plenário do tribunal pode derrubar atos do presidente da República e dos chefes do Legislativo.
A avaliação de integrantes do STF nos bastidores é que o deputado irá segurar a matéria para manter uma boa relação com o Supremo devido às decisões do ministro Gilmar Mendes de barrar investigações contra ele.
Gilmar anulou provas relacionadas a Lira em investigação sobre supostos desvios de recursos públicos em contratos de kit robótica que envolvem aliados do deputado. Antes, o ministro já havia determinado a suspensão da investigação.
Ministros também dizem acreditar que a ação do presidente do tribunal, Luís Roberto Barroso, de retirar de pauta julgamentos polêmicos, como a descriminalização das drogas e do aborto, foi uma sinalização importante ao Legislativo e ajuda a reduzir a pressão na Câmara pela votação da PEC.
Deputados e senadores se queixam de ações do Supremo que, dizem, interfere em prerrogativas do Legislativo. Além dos casos das drogas e do aborto, eles também citam o julgamento do STF que determinou inconstitucional a tese do marco temporal das terras indígenas.
Mesmo se a avaliação estiver errada e os deputados aprovarem o texto, ministros do STF afirmam nos bastidores que o tribunal tem maioria para invalidar a PEC das decisões individuais.
Os magistrados dizem em conversas reservadas que a PEC viola a Constituição por limitar o acesso dos cidadãos à Justiça, uma vez que muitos pleitos judiciais são atendidos via decisões individuais.
O decano da corte, ministro Gilmar Mendes, já deu indícios, em discurso no início da sessão desta quinta (23), que o Supremo não hesitaria em derrubar a PEC.
"O fato é que este Supremo Tribunal Federal, sempre atento às suas responsabilidades institucionais e ao contexto que o cerca, está preparado para enfrentar, uma vez mais e caso necessário, as investidas desmedidas e inconstitucionais provenientes, agora, do Poder Legislativo", afirmou.
O magistrado fez duras críticas à PEC e usou a expressão "pigmeus morais" para se referir a seus apoiadores.
Barroso também fez uma fala em defesa do Supremo e afirmou que o Brasil vive diversos problemas, como crime organizado e mudança climática, e que mudanças na corte não devem ser a prioridade do país.
"O STF não vê razão para mudanças constitucionais que visem alterar as regras de seu funcionamento", afirmou.
Barroso disse que o Supremo enfrentou negacionismo na pandemia da Covid-19 e o negacionismo climático devido às queimadas na Amazônia, além de ter sido um "dique de resistência contra avanço autoritário".
A ala ligada ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) no Senado sempre defendeu a aprovação da proposta. O texto, porém, só avançou após ganhar o apoio do presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
Foram 52 senadores a favor, 18 contra e nenhuma abstenção, tanto na votação do primeiro como do segundo turno. Até o líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), foi favorável, o que ampliou a crise e inseriu o Executivo na disputa entre os Poderes.
O apoio de Pacheco foi visto por parlamentares como uma movimentação do grupo de Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), que pretende se candidatar ao comando da Casa e busca se aproximar de bolsonaristas ligados à pauta anti-STF.
A PEC define que as chamadas decisões monocráticas não podem suspender a eficácia de uma lei ou norma de repercussão geral aprovada pelo Congresso e sancionada pela Presidência da República --para isso, obriga que haja decisões colegiadas.
Foram ajustados alguns trechos do texto original, com a retirada de um ponto que limitava o pedido de vistas em julgamentos --uma vez que a ex-ministra Rosa Weber já alterou o regimento do Supremo para restringir este dispositivo, que acabava postergando as decisões da corte.
Senado aprovou PEC que limita decisões individuais no Supremo
Por Carolina Pimentel
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), disse que as decisões individuais de um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) não podem se sobrepor ao Congresso Nacional e ao presidente da República.
A declaração ocorre após o Senado ter aprovado nessa quarta-feira (22) proposta de emenda à Constituição (PEC) que limita as decisões monocráticas (individuais) dos ministros da Corte Suprema e demais tribunais. Mais cedo, nesta quinta-feira (23), o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luís Roberto Barroso, disse que a proposta é desnecessária e não contribui para o Brasil.
"Estamos promovendo uma busca de equilíbrio entre os Poderes, para que uma lei, votada no Congresso Nacional, que é formado por representantes do povo brasileiro, não seja descontruída por um ato unilateral de uma pessoa, que por mais importância que tenha, como ministro do Supremo Tribunal Federal, não se sobrepõe ao Congresso Nacional, não se sobrepõe ao Presidência da República, não se sobrepõe ao colegiado da sua própria Casa", afirmou Pacheco.
De acordo com Pacheco, a proposta tem embasamento técnico, foi amplamente debatida com a sociedade e pelos senadores e busca equilíbrio entre os Poderes. Ele argumenta ainda que a própria Constituição prevê que declarações de inconstitucionalidade de leis devem ser tomadas pela maioria absoluta do colegiado do STF, o que não vem sendo, segundo ele, cumprido no país.
“Não podemos admitir que a individualidade de um ministro do Supremo Tribunal Federal declare inconstitucional uma lei sem a colegialidade do Supremo Tribunal Federal. Portanto, não admito que se queira politizar e gerar um problema institucional ao entorno de um tema que foi debatido com a maior clareza possível, que não constitui nenhum tipo de enfrentamento, nenhum tipo de retaliação, e nós jamais nos permitiríamos a fazer isso, porque é algo puramente técnico”, disse em entrevista à imprensa.
Pacheco afirmou, que como presidente do Senado, já defendeu o STF e seus ministros. Ele ressaltou que nenhum Poder detém monopólio para defesa da democracia nem é intocável.
“Quero dizer que nenhuma instituição tem o monopólio da defesa da democracia no Brasil. Aqui desse púlpito e do plenário do Senado Federal, eu, como presidente do Senado, defendi o Supremo Tribunal Federal, defendi a Justiça Eleitoral, defendi as urnas eletrônicas, defendi os ministros do Supremo Tribunal Federal, defendi a democracia do nosso país, repeli a todo o momento as arguições antidemocráticas”, disse. “Isso não significa que as instituições sejam imutáveis, intocáveis em razão de suas atribuições”, acrescentou.
Barroso
Além de considerar desnecessária a PEC aprovada pelo Senado, o presidente do STF afirmou nesta quinta-feira que a matéria "não contribui para a institucionalidade do país".
"O Supremo Tribunal Federal não vê razão para mudanças constitucionais que visem a alterar as regras de seu funcionamento. Num país que tem demandas importantes e urgentes, que vão do avanço do crime organizado à mudança climática que impacta a vida de milhões de pessoas, nada sugere que os problemas prioritários do Brasil estejam no Supremo Tribunal Federal", declarou.
O ministro Gilmar Mendes, decano do STF, disse que alterar as regras que garantem o funcionamento do Supremo pode ser considerado inconstitucional. Mendes também afirmou que a Corte não admite intimidações. "Esta Casa não é composta por covardes, não é composta por medrosos", concluiu.
Pela PEC, ficam proibidas decisões monocráticas para suspender leis ou atos dos presidentes da República, da Câmara dos Deputados e do Senado. As decisões para suspensão dessas normas devem ser tomadas de forma colegiada.
O texto segue para Câmara dos Deputados, onde não há prazo da votação da matéria. Para ser promulgada, a proposta também precisa ser aprovada em dois turnos no plenário da Casa.