O ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, disse no último domingo, 13, que “muitos governadores ainda pensam que os Estados membros da federação são soberanos”. A fala ocorreu em um evento com advogados de esquerda e magistrados em São Paulo, promovido pelo grupo Prerrogativas, em que o ministro falou sobre a importância da PEC da Segurança Pública
Por Raisa Toledo
Segundo Lewandowski, que não mencionou nenhum governador em específico, os chefes do Executivo de alguns Estados estariam interpretando a situação sob um olhar da primeira Constituição republicana do País, de 1891. Nela os Estados eram soberanos, com ampla autonomia jurídica, assim como na Constituição americana.
“As constituições locais se intitulavam soberanas, ao invés de autônomas, tinham legações diplomáticas, (os Estados) contraíam dívidas externas. Então muitos governadores ainda pensam, talvez sob esse olhar, que realmente os Estados membros da federação são Estados soberanos, quando na verdade não são. Eles são autônomos, dentro daquela autonomia que é prevista na Constituição Federal [de 1988]”, disse Lewandowski no encontro com advogados.
No pacto federativo previsto pela Constituição Federal de 1988, os entes da Federação (União, Estados, Distrito Federal e municípios) têm competências exclusivas e atribuições comuns. O ministro ressaltou que o federalismo é cooperativo e que, na área da segurança, as forças têm que se integrar.
A integração entre os entes da federação na área é exatamente um dos principais pontos da PEC da Segurança Pública, que também amplia as atribuições das polícias federais, inclui previsões de financiamento do setor na Constituição e democratiza colegiados que formulam diretrizes de segurança para o País, entre outras medidas.
Lewandowski defendeu que o Sistema Único de Segurança Pública (SUSP) precisa estar previsto na Constituição e lembrou que o Sistema Único de Saúde (SUS) orienta diretrizes a todo o País e “ninguém reclama que há interferência na autonomia dos Estados”. A fala é uma referência a protestos de governadores que alegam que a PEC da Segurança Pública quer tirar prerrogativas dos Estados.
A proposta, elaborada pelo ministério, foi enviada ao presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), e a líderes partidários na última terça-feira, 8. Como mostrou a Coluna do Estadão, Lewandowski busca apoio para a aprovação das medidas, mas parlamentares contrários ao Palácio do Planalto estudam estratégias para desgastar a proposta.
O ministro chegou a recorrer ao ex-presidente Michel Temer (MDB), aceito na oposição e no Centrão, como uma tentativa de mostrar que a proposta contém um apelo mais amplo, e não apenas o DNA do governo Lula e do PT.
O presidente da Câmara, Hugo Motta, disse que o texto será encaminhado à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa e que deve criar um grupo de trabalho permanente para discutir questões relacionadas à segurança pública.
Em Brasília, interlocutores garantem que o presidente da Câmara não irá ceder e explicam por qual razão ele não tem medo das ameaças bolsonaristas
Por Henrique Rodrigues
Apesar da pressão bolsonarista, o deputado Hugo Motta (Republicanos-PB) permanece resistente à urgência para o PL da Anistia. Com apoio de setores ligados ao presidente Lula e ao PT, Motta se mostra blindado contra as ameaças políticas da extrema direita, em meio ao avanço da pauta no Congresso.
Mesmo com 262 assinaturas obtidas nesta segunda-feira (14), número superior às 257 necessárias para protocolar o pedido de urgência, o presidente da Câmara dos Deputados não deve ceder à pressão para pautar o PL da Anistia. A proposta visa conceder anistia aos condenados pelos atos antidemocráticos de 8 de Janeiro.
Com o pedido de urgência já protocolado, Motta não deve se intimidar e seguirá ignorando a pressão. Nas últimas semanas, a ofensiva da base bolsonarista incluiu declarações ríspidas e desrespeitosas contra o presidente da Casa, como a do pastor Silas Malafaia, que chamou Motta de “vergonha do povo da Paraíba” num ato público na Avenida Paulista, em São Paulo. No entanto, interlocutores afirmam que ele “não teme danos à sua imagem política” e a razão é bem simples.
A base eleitoral de Motta está consolidada na Paraíba, onde Lula obteve quase 67% dos votos no segundo turno da eleição presidencial de 2022. Essa vantagem também foi vista no município de Patos, onde o atual prefeito é o pai do deputado, bem como nas cidades de seu entorno. Líderes petistas têm laços históricos com a família Motta, e um bom exemplo foi a presença do atual ministro Alexandre Padilha, da Saúde, na última eleição municipal na cidade do sertão paraibano.
Os interlocutores mais próximos de Motta explicam que ele aposta em uma eventual revisão das penas, sem necessariamente abraçar o PL da Anistia, o que, em tese, permitiria amenizar a pressão da extrema direita sem entrar em confronto direto com a base de Lula.
Chapa encabeçada por Paulo Lamac, apoiada pela ex-senadora, recebeu 73,5% dos votos contra 24% da ministra do Meio Ambiente
Com Agências
Pela terceira vez consecutiva, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, saiu derrotada do Congresso Nacional da Rede Sustentabilidade. No 6º encontro do partido, realizado neste fim de semana em Brasília, seu aliado Giovanni Mockus perdeu a eleição interna para o grupo liderado por Heloísa Helena. O secretário de Relações Institucionais de Belo Horizonte, Paulo Lamac, foi eleito o novo porta-voz da legenda neste domingo.
O período que antecedeu o congresso foi conturbado. A ala ligada a Marina chegou a judicializar o processo, pedindo a suspensão do pleito, mas a liminar foi derrubada na quinta-feira à noite, horas antes do início do evento.
Outro ponto de tensão é a relação com o governo federal. Marina compõe a gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva como ministra do Meio Ambiente, enquanto Heloísa mantém uma postura crítica ao PT desde 2003, quando foi expulsa do partido por se opor à reforma da Previdência no primeiro mandato de Lula.
Em contrapartida, aliados de Marina gritaram “Glauber Fica”, em alusão ao deputado federal Glauber Braga (PSOL-RJ), que sofre um processo de cassação na Câmara. Heloísa Helena é sua suplente.
Do Globo
Principal projeto sobre o tema, PL das Fake News está parado na Câmara
POR TÂMARA FREIRE
O governo federal vai tentar uma nova aproximação com o Congresso nas próximas semanas para que o tema da regulação das plataformas digitais volte à agenda dos legisladores, afirmou o Secretário de Politicas Digitais da Presidência da República, João Brant.
"O governo está terminando de definir sua posição de mérito e de estratégia. Nossa compreensão é que essa regulação precisa equilibrar três coisas: primeiro, a responsabilidade civil das plataformas; segundo, o que a gente chama de dever de prevenção e precaução, que significa a necessidade de atuar preventivamente para que não haja disseminação de conteúdos ilegais e danosos a indivíduos ou a coletividades; e terceiro, que elas atuem na mitigação dos riscos sistêmicos da sua atividade", defendeu Brant na última semana, em palestra na Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).
A principal proposta de regulação das plataformas digitais, o Projeto de Lei 2.630 de 2020, conhecido como PL das Fake News, já foi aprovado pelo Senado e está em análise na Câmara dos Deputados. A falta de um acordo, porém, impede que ele avance desde o ano passado.
Atualmente, essas empresas respondem ao Marco Civil da Internet, aprovado em 2014. No seu Artigo 19, a lei diz que que as redes sociais só podem ser responsabilizadas por conteúdo ofensivo ou danoso postado por usuários caso descumpram uma ordem judicial de remoção, à exceção de conteúdo sexuais não autorizado ou casos que violam direitos autorais.
No dia-a-dia, a moderação dos conteúdos cabe às plataformas, que têm políticas próprias para decidir sobre a exclusão de conteúdos violentos ou mentirosos.
"Quando você vai discutir regulação ambiental, por exemplo, o tempo inteiro você olha para os riscos sistêmicos, aqueles riscos que são inerentes à atividade, que afetam direitos fundamentais ou outros marcos legais relevantes. E é preciso mitigar esses efeitos, impor responsabilidades e custos. E o que a gente tem é uma distorção do ambiente digital, sem que as plataformas assumam qualquer responsabilidade", argumentou o secretário.
O uso das redes sociais para cometer crimes continua no centro do debate público em meio às denúncias de violências cometidas contra crianças e adolescentes, e tem reacendido a discussão sobre a regulação das chamadas big techs, as empresas que controlam essas plataformas.
O coordenador do Centro de Referência para o Ensino do Combate à Desinformação da Universidade Federal Fluminense, Afonso Albuquerque, concorda que a regulação das redes se tornou uma questão fundamental e é preciso mais do que responsabilizar as plataformas por esses conteúdos.
"É preciso ter regras relativas ao financiamento dessas plataformas que, de alguma forma, estabeleçam princípios de transparência algorítmica. Nós temos um agente que tem uma capacidade imensa de intervir nos debates nacionais e, hoje, efetivamente, nós operamos no terreno da mais pura ilegalidade"
No entanto, ele não vê um cenário favorável a essa discussão, no Congresso Nacional, a princípio. Mas uma ajuda indireta e imprevista pode vir dos efeitos do governo de Donald Trump, nos Estados Unidos: "Nós estamos vivendo um momento muito caótico, no qual não é possível fazer análises muito claras. Algumas semanas atrás, nós tínhamos uma situação de fechamento das plataformas com os interesses do governo Trump. Mas, agora que as tarifas estão afetando o bolso dos bilionários que apoiaram o Trump, esse não é um cenário tão transparente assim".
Para Afonso Albuquerque, as ações de Donald Trump também têm colocado os Estados Unidos em oposição a muitos países, incitando em muitos deles a necessidade de defender sua soberania em diversos campos, inclusive contra a influência das plataformas digitais americanas.
"Ele e os personagens envolvidos, particularmente o Elon Musk, mas o [Mark] Zuckerberg também, demonstraram pouca sutileza no seu interesse de intervir em assuntos internos de outros países, particularmente do Brasil. E, ao fazer isso, eles levantam a agenda da soberania. Eu acho que essa ameaça está presente desde que as plataformas existem, mas o comportamento agressivo dos integrantes do governo Trump, particularmente sua aliança com os setores da extrema direita anti-institucional do Brasil, tornam muito visível essa ameaça", explica o especialista.
O Secretário de Politicas Digitais da Presidência da República, João Brant, acrescenta que os resultados dos embates entre Musk e o Supremo Tribunal Federal criaram um precedente positivo não só para o Brasil:
"É um momento em que se testa, se esgarça essa relação com os estados nacionais. O mundo inteiro fica olhando para ver o que que o Brasil vai fazer, e o Brasil toma uma decisão de suspender o serviço enquanto não cumprisse as ordens judiciais.
O melhor dessa história é que ela termina com o Musk tendo que sucumbir ao Estado brasileiro, topando cumprir as regras para voltar ao ar. "Eu diria que ali foi um momento de virada em que vários países entenderam que a gente não pode lidar com naturalidade com o fato de que eles escolhem quais regras vão cumprir."
Brant também acredita que duas situações frequentes podem contribuir para que a população pressione os legisladores em direção à regulação: "A própria proteção de crianças e adolescentes, que eu acho que é um tema chave, em que fica mais explícito o problema, e também a quantidade de golpes e fraudes no ambiente digital, e uma parte das plataformas é inclusive sócia desses golpes, porque recebe dinheiro para veicular conteúdo fraudulento."
Já o coordenador do Centro de Referência para o Ensino do Combate à Desinformação da UFF, Afonso Albuquerque, defende que é preciso ir além das regulações nacionais, com a criação de mecanismos transnacionais pactuados e instituições de governança que estabeleçam e fiscalizem o cumprimento de regras globais.
A ministra das Relações Institucionais esclarece sua fala sobre condenados do 8 de janeiro
Por João Pedro Lima
Gleisi Hoffmann, ministra das Relações Institucionais do governo Lula (PT), usou as redes sociais na manhã desta sexta-feira (11) para esclarecer seu posicionamento em relação à possível anistia dos condenados pelos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023.
Na quinta-feira (10), a ministra tinha afirmado que o debate do tema na Câmara é "defensável do ponto de vista de alguns parlamentares".
A fala de Gleisi foi alvo de críticas dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), ainda na quinta. Ao publicar sobre o tema nesta sexta, Hoffmann se posicionou de forma mais contundente sobre o assunto, afirmando que as revisões de penas cabe "única e exclusivamente" ao Supremo.
"Quero deixar claro que eventuais revisões de pena aos réus do 8 de Janeiro cabem única e exclusivamente ao Supremo Tribunal Federal, que conduz os processos. Entendo sim que esse debate pode e deve ser feito na sociedade, inclusive no Congresso, como já vem acontecendo de fato, mas sem interferir na autonomia do Poder Judiciário.
Reafirmo minha crítica ao PL da Anistia e seu substitutivo, que visam a impunidade de Bolsonaro e dos comandantes do golpe. São eles que manipulam a questão das penas para confundir a população e encobrir o objetivo de não pagar pelos crimes que cometeram contra a democracia", publicou a ministra na rede social X.
Gleisi se diz contra o projeto de anistia
Em entrevista ao blog da jornalista Andréia Sadi, do g1, a ministra das Relações Institucionais afirma que seu comentário feito na quinta-feira foi mal colocado. Segundo Gleisi, o que ela quis dizer é que "O que eu quis dizer é que cabe ao Congresso fazer a mediação com o Judiciário das questões envolvendo o 8/1 dessas reclamações que parlamentares estão fazendo sobre penas elevadas".
Segundo o blog, Hoffmann acha que a conversa cabe ao congresso, mas revisar a pena é do Judiciário. Ela também reafirmou ser contra o projeto de anistia, por considerar que ele visa à "impunidade de Bolsonaro e dos comandantes do golpe".
No fim da noite desta quinta, o PL da Anistia conseguiu os 257 votos necessários para dar início à tramitação de um pedido de urgência. Entenda o que isso significa clicando aqui.